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quinta-feira, março 28, 2024

Para sermos realmente livres, só com a revolução socialista!


Artigo publicado no Dossiê Juventude da
Revista Correio Internacional (Nova Época) nº 5, junho de 2011.

 
Por Daniel Sugasti
A juventude é a chama da revolução. Evocando as gerações passadas de lutadores operários e socialistas, a juventude irrompe novamente na cena política mundial com a energia, ousadia e indomável irreverência daqueles que, consciente ou inconscientemente, lutam para derrubar um sistema que lhes rouba seu presente e seu futuro. A juventude operária e empobrecida do século XXI não acredita no conto do fim da história.
 
Duas décadas após a queda dos regimes stalinistas na ex-URSS e a restauração do capitalismo, a juventude não acredita, ou melhor, não sente a tão propagada superioridade do capitalismo sobre o socialismo que os propagandistas a serviço do imperialismo tanto alardearam.
 
Esta é uma das razões pelas quais a juventude estudantil, trabalhadora e desempregada não só participa ativamente, mas, em muitos casos, está na vanguarda do atual processo revolucionário no mundo árabe e nas lutas contra os planos de ajuste dos governos europeus.
 
Em outros artigos deste dossiê, analisamos as profundas causas estruturais que alimentam a participação da juventude nesses processos e como estes são dinamizados com sua irrupção no cenário político, por não carregar em suas costas o peso das derrotas passadas nem ser controlada pelas velhas organizações burocráticas.
 
Qual é o caminho que a luta da juventude deve seguir para avançar por um rumo revolucionário? Qual é a proposta da LIT-QI aos jovens lutadores neste sentido? Para responder a estas questões, parece-nos necessário abordar, de modo crítico, duas concepções de luta que ganharam espaço entre os jovens neste período recente.    
 
As limitações do “gandhismo”
 
A partir dos processos revolucionários na Tunísia e no Egito, apareceu com bastante força a reivindicação do “gandhismo”. Esta concepção de luta foi formulada por Mahatma Gandhi, líder da rebelião pela independência nacional da Índia em relação ao império inglês, na primeira metade do século XX.
 
Gandhi propunha uma mobilização das massas, contínua e pacífica, que não respondesse à repressão com violência. Por isso, sua posição ficou conhecida como “resistência pacífica”. Para ele, a força e a continuidade da mobilização de massas e a justeza de suas reivindicações terminariam garantindo a vitória. À primeira vista, suas concepções teriam triunfado, pois a Índia conquistou sua independência em 1947.
 
Nos processos tunisiano e egípcio, embora não possam ser qualificados de “pacíficos” (ocorreram várias centenas de mortes), as quedas de Ben Ali e Mubarak não foram precedidas por confrontos violentos de caráter generalizado. Poderíamos concluir, então, que esta concepção “pacifista” triunfou, ao menos parcialmente.
 
Há um aspecto que compartilhamos plenamente com os jovens que têm referência no gandhismo: a reivindicação das grandes ações autônomas das massas como método de luta frente à ação dos “aparatos esclarecidos”. Isto é, as revoluções são feitas pelas massas mobilizadas.
 
Outro aspecto que compartilhamos com eles é a reivindicação da necessidade da mais ampla democracia no interior dos processos de mobilização e luta. No entanto, é uma ilusão atribuir a Gandhi e à sua organização (o Partido do Congresso) a defesa de uma “democracia de massas”. Tanto ele quanto seu partido eram burgueses, portanto  preocupavam-se particularmente em controlar as massas através de um “aparato vertical”, cujas decisões eram tomadas na cúpula, sem debate na base.
 
Preocupavam-se, especialmente, em evitar que o movimento operário se mobilizasse de modo autônomo. Por exemplo, em 1921, desenvolvia-se uma greve geral dos trabalhadores indianos contra o domínio colonial, que se radicalizava cada vez mais, com crescentes choques com as tropas britânicas. Gandhi iniciou uma greve de fome em Déli com o objetivo de “pacificar” o movimento, mas, de fato, para dividi-lo.
 
Um contexto excepcional
 
Vejamos agora o tema do triunfo “pacífico” da luta de Gandhi. Este fato somente pode ser compreendido no contexto absolutamente excepcional em que se deu. Por um lado, a Inglaterra vivia, na primeira metade do século XX, um grande retrocesso como potência imperialista. Buscava recompor seus domínios deixando de lado o velho sistema colonial e aceitando o surgimento de países semicoloniais formalmente “independentes”, como fez no Oriente Médio. Era uma mudança tática devido a uma nova realidade.
 
Por outro lado, os Estados Unidos, como potência imperialista hegemônica emergente, ao mesmo tempo em que se aliavam à Grã-Bretanha para derrotar os nazistas, lutavam para substituir a influência inglesa na Ásia e, por isso, alentaram e fortaleceram o projeto gandhista. Sem esta combinação excepcional, hoje praticamente irrepetível, teria sido impossível um triunfo da “resistência pacífica” na Índia.
 
Outro aspecto do gandhismo que criticamos duramente é que, por ser um movimento burguês, não avançou para a expropriação das grandes empresas que dominavam o país. Apesar de conseguir a independência formal, a Índia tornou-se uma semicolônia dominada pelo imperialismo. Dessa forma, mantiveram-se os altíssimos índices de pobreza e miséria que caracterizam o país e subsistem até nossos dias, apesar de que houve um forte desenvolvimento econômico e de ser considerado uma das chamadas “potências emergentes”.
 
O que se passou no Egito?
 
A revolução egípcia também tem um caráter bastante excepcional: a cúpula do exército decidiu que as forças armadas não participariam diretamente da repressão às mobilizações e isso facilitou as coisas para as massas.
 
Esta atitude da cúpula militar não se deveu a nenhuma “vocação democrática”: era a mesma instituição que sustentou a ditadura de Mubarak durante décadas e que, financiada pelos EUA, armava-se para ajudar Israel contra a resistência palestina. Também não se deveu a que a “força moral” das reivindicações das massas os tivesse convencido, mas, sim, a um perigo muito concreto. O contato constante e a confraternização dos soldados e da baixa oficialidade com os manifestantes levavam ao risco real de que, ante uma ordem de repressão em massa, o exército se dividisse diante da força revolucionária do povo egípcio e a situação piorasse para a defesa de seus interesses.
 
Nessas condições, o imperialismo e a burguesia egípcia optaram por aceitar a queda de Mubarak para manter a unidade do exército, formar um novo governo e recompor um regime político que lhes permitisse manter o controle do país, usando o prestígio que conservou entre a população. Hoje, as novas mobilizações, as greves e a solidariedade com os palestinos contra Israel são duramente reprimidas, demonstrando que a violência está e estará presente toda vez que as massas lutarem para conquistar suas aspirações.
 
E o resto dos países árabes?
 
Nem as massas nem os revolucionários escolheríamos voluntariamente os choques violentos ou as guerras porque, para nós, representam duros sacrifícios e sofrimentos. O problema é que não se trata de um “livre arbítrio”: o imperialismo e as burguesias nacionais estão dispostos a tudo para defender seus interesses e privilégios, inclusive a mais impiedosa violência contra os povos.
 
Isto fica absolutamente claro no processo revolucionário árabe. A sangrenta invasão saudita a Bahrein, a feroz repressão dos regimes da Síria e do Iêmen, a guerra civil na Líbia e a intervenção militar imperialista neste país são uma mostra disso. Diante destes ataques da contrarrevolução, a única alternativa é uma resposta violenta das massas que, quanto mais ampla e organizada, inclusive no terreno militar, aumentará a possibilidade de triunfo da luta. O gandhismo ensina o contrário (nenhuma resposta violenta) e, nesse sentido, só levará a duríssimas derrotas.
 
Marx dizia que “a violência é a parteira da História”. Com isto queria expressar que todas as grandes mudanças políticas e sociais são precedidas e acompanhadas por choques violentos entre os setores sociais que lutam para avançar e aqueles que defendem o status quo.
 
Sobre a luta pela “democracia”
 
Nas mobilizações do mundo árabe e em outras partes do mundo onde a juventude está intervindo, a luta pelas liberdades democráticas e pela “democracia” em geral tem um peso muito importante. É uma luta muito correta, compartilhada e apoiada por nós.
 
Em primeiro lugar, porque muitas delas são dirigidas contra regimes ditatoriais ou bonapartistas que eliminam totalmente ou restringem essas liberdades. Em segundo lugar, porque essas liberdades democráticas são muito necessárias para que os trabalhadores e os jovens possam se organizar e lutar melhor. Por isso, é totalmente correto lutar por elas e defendê-las quando são conquistadas e estão ameaçadas.
 
No entanto, é necessário avançar nesta análise: sob o capitalismo, nunca haverá verdadeira democracia para as massas. Mesmo no regime democrático burguês mais completo, esta democracia sempre será bem mais de forma que de conteúdo.
 
Isto porque, por um lado, são as grandes empresas e bancos que dominam a economia e ditam as “regras do jogo”, qualquer que seja a opinião política das massas. Quem votou, por exemplo, as gigantescas ajudas aos especuladores financeiros e os duríssimos planos de ajuste? Por outro, e como consequência disso, esta democracia burguesa não garante direitos democráticos de “conteúdo” para os trabalhadores e os jovens, como emprego, salário digno, saúde e educação públicas, gratuitas e de qualidade etc.
 
Em uma verdadeira democracia, as massas trabalhadoras deveriam controlar a economia para atender a satisfação de suas necessidades mais urgentes, e não a dos capitalistas e seus lucros. Mas os capitalistas e seus representantes políticos jamais aceitarão isto.
 
Os capitalistas dominam a sociedade por uma via de mão dupla. Por um lado, são os donos das fábricas e dos bancos. Por outro, controlam o Estado burguês, por meio dos partidos a seu serviço (mesmo que se apresentem “ideologicamente” enfrentados entre si). E se, por causa de um recrudescimento da luta de classes, a situação fica mais complicada, aparecem as Forças Armadas, a repressão, os golpes de Estado etc. É neste sentido que Marx explicava que mesmo a maior democracia burguesa continua sendo uma “ditadura do capital”.
 
Por isso, essa verdadeira democracia política e econômica aspirada pelos jovens e trabalhadores não poderá ser conquistada pelo caminho da “ampliação” ou “reforma” da democracia burguesa. É necessário mudar pela raiz as bases econômicas capitalistas e o Estado burguês que as defende. Não há como avançar para uma “democracia de conteúdo” (ter emprego, salário, saúde, educação e verdadeiras liberdades democráticas) sem destruir este sistema de dominação. Isto é, sem que a classe operária e o povo tomem o poder político, destruam o Estado burguês e sua “coluna armada”, substituindo-o por um Estado operário, de novo tipo. E sem que, a partir daí, as grandes empresas sejam expropriadas e toda a economia seja orientada para satisfazer as necessidades populares. Isto não é nada mais que a revolução socialista, a única via “real” que a história demonstrou para conquistar uma “democracia real”. Fora dessa alternativa, as aspirações de “mudar o mundo” sem destruir o capitalismo mostraram-se meras ilusões.
 
É muito importante assinalar que a proposta de revolução socialista que defendemos não tem nada a ver com a caricatura nacionalista e burocrática que o stalinismo apresentava sob o nome de “socialismo real”. Nossa proposta é internacional e aponta para a conquista e garantia das mais amplas liberdades para os trabalhadores e o povo.
 
Propor como orientação estratégica a luta pela revolução socialista significa que os processos de luta concretos pelas reivindicações mais sentidas, incluindo as liberdades democráticas, não têm importância? Não, ao contrário: impulsioná-los e intervir neles é imprescindível. Por um lado, porque nesse processo de mobilização independente das massas, e nos resultados dos choques com seus inimigos (triunfos ou derrotas), define-se a relação de forças e a dinâmica dos processos revolucionários. Por outro, é o resultado dessa mobilização e dessa experiência que faz com que as massas avancem em sua consciência, compreendendo que o capitalismo já não está disposto a dar nada e que as conquistas obtidas são efêmeras se não se avançar rumo à revolução socialista. 
 
Juventude e revolução
 
Na revolução, a juventude tem um papel de primeira grandeza. Assim foi na Revolução Russa de outubro de 1917 e em outros processos, como na Espanha nos anos 1930, em Cuba em 1959, em Portugal em 1974 ou no Maio Francês em 1968.
 
Com a mesma força e decisão, participa à frente da “primavera árabe” e nas atuais lutas na Grécia, França, Portugal, Inglaterra e Espanha. Por sua histórica capacidade de luta e rebeldia, a juventude é um fator decisivo na definição de qualquer processo revolucionário.
 
Nossa proposta para esta juventude combativa é que se some de modo consciente à luta pela revolução socialista como uma referência estratégica que guie seus combates atuais.
 
A unidade com a classe operária
 
Neste caminho, há um primeiro passo imprescindível: a unidade dos jovens com a classe operária. Como no Egito, onde uma das organizações juvenis mais ativas, o “Movimento 6 de Abril”, tinha esse nome porque começou a atuar em apoio a uma greve dos operários têxteis de Mahallah, iniciada nessa data em 2008. Também começa a se expressar na Europa com a luta comum entre jovens e operários.
 
É uma unidade estratégica, porque o futuro das novas gerações depende da possibilidade de mudar este sistema e isto depende centralmente da luta da classe operária. As novas gerações só podem esperar melhores dias se o proletariado cumprir sua missão histórica de destruir o capitalismo imperialista e construir o socialismo em nível internacional.
 
É um caminho difícil, mas nunca impossível. Qualquer outra saída político-ideológica, como as que pretendem “reformar” ou “humanizar” o capitalismo, não passa de uma utopia reacionária, porque acabam criando ilusões e dando a este sistema uma sobrevida cada vez mais custosa para a humanidade.
 
Organizar a juventude estudantil e trabalhadora para a revolução!
 
Além desta firme ligação com a classe operária, a LIT-QI defende a necessidade de construir partidos revolucionários em cada país, como seções de um partido revolucionário internacional.
 
Afirmamos que, sem uma ferramenta deste tipo, isto é, sem uma direção revolucionária consciente que tenha como objetivo incentivar e dirigir essas lutas até suas últimas consequências, o heroísmo e o sacrifício das massas em suas lutas serão dissipados, e o poder continuará nas mãos dos mesmos exploradores de sempre.
 
A história está cheia de grandiosas revoluções derrotadas ou desviadas por não contar com uma direção revolucionária capaz de encabeçar a tomada do poder político do Estado ou estender e defender esse triunfo em nível internacional.
 
Por isso, chamamos os melhore ativistas estudantis, operários, camponeses e de setores populares a se somarem a esta tarefa. Somente a revolução socialista pode dar um futuro à humanidade e, especialmente, à juventude. Da mesma forma, somente a militância em um partido operário, revolucionário, socialista e internacionalista pode tirar milhares de jovens da alienação à que o capitalismo os condena, ao oferecer-lhes uma justa, imprescindível e necessária causa pela qual lutar e se entregar por inteiro.
 
Para a LIT-QI, enfrentar os problemas da juventude conduz inexoravelmente a uma luta anticapitalista sem quartel, uma luta pelo socialismo e pela construção de uma ferramenta poderosa para essa libertação social definitiva: o partido revolucionário de tipo leninista.
 
Reivindicamos plenamente o papel histórico da juventude na luta pela libertação do proletariado mundial que Trotsky expôs, em 1938, ao afirmar que: “Um partido revolucionário deve necessariamente se basear na juventude. Inclusive, pode-se dizer que o caráter revolucionário de um partido pode ser julgado, em primeiro lugar, por sua capacidade de atrair a juventude da classe trabalhadora para suas bandeiras. O atributo básico da juventude socialista – e tenho em mente a juventude genuína e não os velhos de 20 anos – reside em sua disposição para se entregar total e completamente à causa socialista. Sem sacrifícios heróicos, valor e decisão, a história em geral não se move para frente”.
 
Tradução: Marcos Margarido
 
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