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sexta-feira, março 29, 2024

Crise econômica acentua perseguição e morte de imigrantes

As economias imperialistas precisaram de abundante mão de obra barata no auge do crescimento econômico. Isso, junto com a superexploração dos países do chamado Terceiro Mundo, pressionou e continua pressionando milhões de trabalhadores a saírem de seus países de origem, pondo em risco até suas próprias vidas.

Nestes últimos meses, vimos como a crise econômica, cujo fim já havia sido declarado, voltou para frear o incipiente crescimento econômico e ameaça com uma nova recessão nos próximos meses. Os imigrantes – juntamente com as mulheres trabalhadoras e a juventude – foram os primeiros a sofrer as consequências da crise econômica.

As expulsões de ciganos da França

É verdade que na França já se realizavam expulsões de imigrantes antes da volta da crise. O governo francês reconhece que, com as últimas expulsões, o número de imigrantes de etnia cigana postos para fora do país chegava já aos milhares em 2010. No entanto, isso é só uma pequena parte das repatriações levadas a cabo pelo governo de Nicolas Sarkozy. Em 2009, foram 30.000 imigrantes expulsos da França.

Até agora, as expulsões de ciganos são, supostamente, “retornos voluntários”. Dado que são cidadãos da União Européia, estes imigrantes podem voltar à França e o governo francês quer impedir seu retorno. Sarkozy utiliza o argumento das diferenças culturais, do modo de vida da população romani (como são conhecidos os ciganos na França) para reivindicar a necessidade de expulsar os que não tenham meios contínuos de subsistência, de trabalho.

Entretanto, esta população encontra outro problema maior para conseguir trabalho e se estabelecer: o governo francês mantém uma prorrogação até 2012 para que os cidadãos da Bulgária e da Romênia, países incorporados à União Européia em 2007, tenham direito à livre circulação, como todos os demais membros da UE. Os búlgaros e romenos devem conseguir um contrato de trabalho em menos de 3 meses para permanecer na França. Além disso, o governo pretende alongar ainda mais esta restrição e levá-la até 2014. Vale lembrar que a Romênia é um dos países mais pobres da Europa, onde o Fundo Monetário Internacional e a União Européia exigiram uma redução de 25% dos salários dos funcionários públicos e demissões em massa.

Às expulsões de Sarkozy, como às de Berlusconi no ano passado, soma-se a proposta urgente de reforma da lei de imigração para facilitar o repatriamento de imigrantes, apresentada em discurso para a polícia no dia 30 de julho, em Grenoble. Pretende-se incluir como causas de expulsão a mendicância “agressiva”, a falta de meios de susbsistência e a ameaça à ordem pública. Estas medidas seriam aplicadas também a cidadãos da União Européia. E ainda estabeleceriam a retirada da nacionalidade francesa aos imigrantes que a tivessem obtido, em caso de atentado contra a vida de funcionários públicos, especialmente policiais e gendarmes. O objetivo de fundo não é o ataque só a ciganos, mas principalmente ao conjunto dos imigrantes e seus descendentes, que já adquiriram a nacionalidade francesa, justamente os setores mais golpeados pela crise econômica.

A União Européia marcou passo com a Diretiva da Vergonha

O Parlamento Europeu exigiu da França o fim das expulsões em massa, pois são contrárias às leis da UE que permitem o livre trânsito de seus cidadãos. Esta é mais uma hipocrisia da UE, já que seu presidente, o português José Manuel Durão Barroso, já definiu que a liberdade de circulação não é absoluta na União Europeia e dizer o contrário criaria muitos Le Pen (dirigente ultradireitista francês). Ou seja, para que a ultradireita não cresça, façamos o que faria a ultradireita.

Sarkozy segue a linha de Berlusconi, o que é uma consequência do endurecimento da leis contra os imigrantes por parte da União Européia, pois ainda que “Suas Excelências” do Parlamento Europeu (mesmo que apenas algo mais da metade, pois o resto votou contra a denúncia à França) se escandalizem com a expulsão de ciganos, o certo é que a chamada “Diretiva da Vergonha” foi aprovada em julho de 2008 por esse mesmo parlamento.

Lembrando que essa diretiva permite a detenção em centros de internamento de imigrantes “ilegais” até um máximo de 18 meses e exige de todos os países da UE a adequação de suas legislações a esta diretiva no prazo de dois anos, assim como a expulsão de todos os imigrantes irregulares em um prazo de 5 anos. O que, no caso da França, mostra como na União Européia os ataques aos imigrantes já não se restringem aos chamados extracomunitários, mas começam a afetar o conjunto dos trabalhadores imigrantes, venham de onde vierem.

Islamofobia

Uma das mais velhas democracias europeias, a “neutra” Suíça, em referendo em novembro de 2009, votou contra a construção de novos minaretes (torres de onde se chamam os muçulmanos à oração). A ultradireita convenceu os suíços – já que 22% da população não tem direito a votar por ser imigrante – a votarem contra os direitos religiosos dos imigrantes, principalmente kosovares e turcos que professam o islamismo. Esta religião é a de 4,5% da população suíça.

O ataque aos direitos da população muçulmana se estende a vários países europeus, onde têm aparecido diversas leis que, utilizando o argumento de “proteger” os direitos da mulher ou por questões de segurança, proíbem o nihab e a burka, vestimentas usadas por algumas mulheres muçulmanas, e inclusive o véu (que cobre somente o cabelo) para ir à escola.

Nos EUA, um pastor evangélico ameaçou queimar publicamente um exemplar do Alcorão (livro sagrado dos muçulmanos) no aniversário do atentado do 11 de Setembro contra as Torres Gêmeas (outros finalmente o fizeram).

Na Alemanha, Thilo Sarrazin, membro do Conselho Executivo do Bundesbank (banco central alemão), publicou um livro defendendo que a sociedade alemã estava se tornando menos inteligente pelo aumento de crianças de imigrantes muçulmanos. Finalmente, demitiu-se de seu cargo, ainda que seu livro racista seja um sucesso de vendas. Além disso, há poucos dias, a chanceler alemã Angela Merkel premiou, como defensor da liberdade de expressão, o caricaturista dinamarquês que desenhou Maomé com uma bomba no seu turbante em 2005, provocando a indignação dos muçulmanos.

Geert Wilders, líder ultradireitista no parlamento holandês que considera o islã retrógrado e violento, quer impedir a entrada de imigrantes muçulmanos e proibir o véu e as mesquitas no país. No último dia 11 de setembro, foi a estrela das mobilizações contra o islã do Tea Party dos EUA, em Nova York.

Estes são alguns exemplos da extensão da islamofobia, ou seja, a satanização da religião muçulmana e seus seguidores de forma indiscriminada. A islamofobia se propagou por causa da invasão imperialista comandada pelos EUA ao Afeganistão e ao Iraque em 2001 e 2003. Desde então, foi utilizada para justificar a agressão imperialista e para atacar um setor dos trabalhadores imigrantes.

A islamofobia é, na verdade, mais uma forma de xenofobia ou ódio ao estrangeiro que passou de apenas uma propaganda dos setores ultradireitistas para entrar nos parlamentos e nas instituições “democráticas” cada vez com maior relevo. Por isso, é parte da ofensiva contra os imigrantes, com o mesmo objetivo de buscar bodes expiatórios e dividir os trabalhadores para conseguir aumentar a exploração como forma de sair da crise econômica.

O massacre de imigrantes no México tem sua origem nos EUA

Certamente é correta a denúncia ao governo mexicano por não impedir massacres como o ocorrido no dia 23 de agosto em Tamaulipas. Mas a denúncia não pode parar aí. É preciso questionar por que se produziu esse massacre, por que os imigrantes são sequestrados ou extorquidos por organizações criminosas ou mesmo pela polícia mexicana e muitas mulheres imigrantes são, além disso, violentadas pelos seus captores. Calcula-se em pelo menos 10.000 o número de imigrantes capturados por esses bandos a cada ano no México.

Em primeiro lugar, a causa está na lei migratória do México, uma das mais duras do mundo. Aí já está codificada a imigração como delito. Por outro lado, a fronteira dos EUA está militarizada e o Arizona, além de querer aplicar uma lei que também criminaliza o imigrante, conta com xerifes como Joe Arpaio, dedicados literalmente à caça ao imigrante e ao assédio à população latina.

O principal país imperialista do mundo quer controlar o fluxo de imigrantes de acordo com a sua conveniência. Agora, com a crise econômica, a burguesia norte-americana precisa expulsar uma parte dos imigrantes do país, fechar as fronteiras e, sobretudo, deixar os que ficam mais desprotegidos para que tenham de aceitar piores salários e condições de trabalho exaustivas.
De fato, os trabalhadores imigrantes “ilegais” são a mão de obra barata no país, principalmente na agricultura. E, com a crise, seus salários, já baixos, caíram ainda mais. Obama prometeu na sua campanha eleitoral uma nova lei migratória na qual haveria alguma via para que uma parte dos 12 milhões de “sem documentos” pudessem legalizar sua situação. Chegou a crise, trazendo 10% de desemprego e leis como a do Arizona, que contam com apoio de 60% dos norte-americanos, e a nova lei (que na verdade não seria mais que um remendo e que objetivamente buscaria maior controle dos imigrantes) não chegou.

Obama teve que frear a lei do Arizona por enquanto, porque põe em risco a possibilidade de continuar explorando os imigrantes e penaliza os empresários que os contratam, mas enviou outros 1.200 efetivos da Guarda Nacional à fronteira para contentar os setores mais reacionários. Essa militarização da fronteira teve início com Bush. Obama dá continuidade e aprofunda a medida, enquanto a Flórida e outros 19 Estados anunciam leis como a do Arizona contra os trabalhadores imigrantes.

Criminalizando a imigração para dividir os trabalhadores

O ataque aos imigrantes serve à burguesia para dividir os trabalhadores e jogar uns contra os outros. Os imigrantes se transformam no bode expiatório dos problemas econômicos do país. Com a crise econômica mundial, o ataque aos imigrantes sofreu um salto. Se há desemprego, que se vão os imigrantes; se piora a saúde e a educação, a causa são os imigrantes.

Esse é o discurso da ultradireita, mas que foi tomado de uma forma ou de outra por todos os governos burgueses. Tem sido feito diretamente por Berlusconi, vinculando a delinquência à imigração ("uma redução dos extracomunitários na Itália significa menos forças para engrossar as fileiras dos criminosos", ABC, 27 de janeiro de 2009) e criminalizando a falta de documentos. E, de forma vergonhosa, quando governos como o de Zapatero falam do quão importantes são os imigrantes para a economia, mas impõem cotas aos filhos dos imigrantes para as escolas, restringem o uso dos serviços de saúde aos imigrantes não regularizados, impõem leis que permitem deter por até 60 dias os imigrantes antes de sua expulsão pelo simples fato de não ter “papéis”. Ou impondo – com o beneplácito e, inclusive, a exigência da burocracia sindical – moratórias à regularização dos imigrantes búlgaros e romenos que já faziam parte da União Européia.

A nova escalada contra os imigrantes tem uma relação direta com a crise econômica e também com um fato novo: começa a se notar a resposta dos trabalhadores ao ataque que estão sofrendo dos governos e dos patrões. Não é que à burguesia não interesse o aumento do número de desempregados, o exército industrial de reserva do qual falava Marx, mas seu excessivo crescimento pode dar lugar a conflitos sociais. Assim, na França, Sarkozy tomou os ciganos como seu cavalo de batalha para ganhar o apoio de um setor da população às medidas xenófobas e dividir os trabalhadores que estão respondendo com mobilizações e greves aos ataques do governo. Estas últimas expulsões ocorrem no momento em que se convoca Greve Geral na França.

É necessária a resposta unificada da classe operária contra a crise e contra o racismo

No entanto, a boa notícia é que os discursos e ações do presidente francês contra os imigrantes e, em particular, contra os imigrantes ciganos romenos e búlgaros, não foram suficientes para impedir as mobilizações de cerca de 100.000 franceses (77.000 segundo a polícia) no último dia 4 de setembro contra as expulsões e que, três dias depois, se produzisse a anunciada greve geral.

Esta greve contra a elevação da idade de aposentadoria de 60 para 62 anos teve maior adesão que a anterior, de 24 de junho, e os sindicatos já anunciaram sua continuação para o dia 23 de setembro. Também podemos destacar os protestos que houve pelas expulsões na França em frente às suas embaixadas em vários países europeus (Portugal, Espanha, Bélgica, Itália, Sérvia e Reino Unido). Na Itália, depois dos enfrentamentos racistas contra os trabalhadores imigrantes africanos, encorajados por setores mafiosos em Rosarno, ocorreram mobilizações em defesa dos imigrantes.

Também é preciso assinalar as mobilizações dos latinos tanto no Arizona quanto em outras partes dos EUA contra a famosa lei anti-imigração. Os protestos contra esta lei, ou as que estão sendo preparadas em outros Estados, estão criando indignação na América Latina. Os protestos formais dos governos centro-americanos e do mexicano à dita lei não passam de um apoio a Obama para que impulsione sua própria lei de imigração, enquanto aceitam a “colaboração” dos EUA para controlar a passagem de imigrantes. É necessário uma resposta do mundo sindical, da classe operária latino-americana contra a discriminação que sofrem seus irmãos no centro do imperialismo.

No próximo dia 29 de setembro, haverá Greve Geral na Espanha, onde o desemprego já supera 20% da população ativa e os trabalhadores imigrantes, juntamente com os jovens (que têm uma taxa de desemprego de 40%) e as mulheres foram os mais atingidos pela crise econômica. A reforma trabalhista imposta por Zapatero, contra a qual se organiza a greve, pretende precarizar mais ainda as condições de trabalho. As medidas vão golpear diretamente os mesmos setores, mas afetarão o conjunto dos trabalhadores se não forem derrotadas. Por isso, é necessária maior unidade e continuidade na luta entre toda a classe operária.

Nativa ou estrangeira, a mesma classe operária! Esta consigna agora é mais necessária do que nunca contra os ataques aos trabalhadores e setores populares que todos os governos do mundo estão promovendo, especialmente os dos países imperialistas mais afetados pela crise. Que os capitalistas paguem pela crise!

Tradução: Helton Ribeiro

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