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sexta-feira, março 29, 2024

Intifada palestina começa a florescer

A intensificação de ataques de colonos israelenses a palestinos nos últimos meses – inclusive crianças – e a um dos principais locais sagrados para muçulmanos, a Mesquita de Al Aqsa, em Jerusalém, tem acelerado um processo em curso, rumo a um novo levante popular – que tem sido apelidado de “Intifada das facas”.

Por: Soraya Misleh

Diante da cumplicidade de governos de todo o mundo com essa situação insustentável e a traição das lideranças tradicionais, a resistência palestina, histórica, assume nova forma. Humilhados diariamente, expulsos de suas terras e desumanizados, em resposta, palestinos têm enfrentado os colonos (atualmente, a face mais agressiva da ocupação de terras por parte de Israel) como podem. Facas de cozinha e facões são seus instrumentos diante da quarta potência bélica militar no mundo. Nesse enfrentamento, em torno de 40 palestinos perderam a vida, ante dez ocupantes. O movimento vai além: nos territórios ocupados em 1948, onde hoje é Israel, a juventude também se levanta.

Como afirma o revolucionário Leon Trotsky, a revolução é resultado de um processo. Uma nova Intifada – que alguns classificam como a terceira (sendo a primeira em 1987-1993 e a segunda em 2000-2004) e outros como a quarta (contabilizando a revolução de 1936 a 1939) – vem sendo germinada há alguns anos. Estimulada pelas revoluções no mundo árabe, a atual revolta, em ascensão, teve seu prenúncio ainda em 2011. Marco nessa trajetória foram as manifestações pelo direito de retorno, em 15 de maio daquele ano (aniversário da nakba, catástrofe palestina, quando foi criado unilateralmente em 1948 o Estado de Israel como exclusivamente judeu, mediante a limpeza étnica do povo palestino). O movimento foi articulado por página de ativistas da revolução egípcia em rede social. Impulsionado por jovens, começou simultaneamente dentro dos territórios palestinos e nas fronteiras dos países árabes com Israel – e foi reprimido violentamente.

Na sequência, aparentemente, um novo levante ficou em compasso de espera, acompanhando os altos e baixos do processo revolucionário em curso no mundo árabe. Em prol de sua estabilidade, Israel firmou recentemente um acordo de cooperação com a Rússia para encerrar a revolução síria que, apesar da contrarrevolução instalada pelo imperialismo, teima em não se render e a derrubar o ditador Bashar El Assad. Ali o processo dura 4,5 anos e se aprofundou, desencadeando uma sangrenta guerra civil. Israel e seus aliados diretos e indiretos tentam impedir a vitória dessa revolução, o que pode alterar o quadro geopolítico local, rumo à Palestina livre.

Inimigos poderosos em xeque

Esse cenário evidencia que não é possível analisar o que ocorre na Palestina sem lançar um olhar para o mundo árabe. Os tiranos no poder nos países árabes garantem a segurança de Israel. Os mesmos poderosos inimigos que levaram à derrota da revolução de 1936-1939 contra o mandato britânico e a colonização sionista, denunciados pelo revolucionário palestino Ghasan Kanafani em sua obra A revolta da Palestina de 1936-1939 (Editora Sundermann), se mantêm: a burguesia palestina, os regimes árabes e o sionismo/imperialismo. A Intifada que começa a ganhar contornos sólidos deve questionar e expor tais inimigos. Pode representar um ascenso no processo revolucionário no mundo árabe (grandes manifestações em diversas cidades da Jordânia no dia 16 de outubro pelo fim dos acordos com Israel são um sinal).

O levante popular que se desenha difere dos anteriores, iniciados em 1987 e 1993, ao se dar sem qualquer liderança, espontaneamente, e sobretudo pela juventude aliada à classe trabalhadora. Cerca de 40% são mulheres. O presidente da colaboracionista Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, tenta na prática conter a onda, mas na retórica procura se sintonizar de alguma forma com o descontentamento e falta de perspectivas que predominam entre os palestinos. Sob essa lógica, no dia 30 de setembro último, em discurso na Organização das Nações Unidas (ONU), afirmou que romperia com os desastrados acordos de Oslo, firmados em 1993 e que culminaram na ampliação da colonização e apartheid em terras palestinas. Um dos resultados desses acordos é a cooperação de segurança entre a ANP e Israel. O Hamas – cuja diferença é que resiste na faixa de Gaza – tenta capitalizar o levante popular. Fato é que nenhum partido parece convencer a juventude nas ruas hoje. Falta direção revolucionária e a sensação em relação ao mundo é de isolamento.

Movimentos em solidariedade no mundo começam a dar resposta, com manifestações na Europa, nos Estados Unidos, na África e na América Latina, inclusive no Brasil, na capital paulista, no último domingo (dia 18). Sob a bandeira do boicote, desinvestimento e sanções (BDS) a Israel, têm denunciado a cumplicidade de seus governos com o apartheid, ocupação e colonização a que estão submetidos os palestinos. Caso do Brasil, que se tornou um dos maiores importadores de tecnologia militar israelense. Somando nossas vozes e corações à resistência palestina e aos revolucionários no mundo árabe, chamamos por uma Intifada e por boicotes no Brasil e no mundo.

 

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