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sexta-feira, abril 19, 2024

Monarquia: uma estrutura corrupta herdada do franquismo

O fato da Monarquia não estar atravessando seu melhor momento vem de longe. A imagem de um rei caçando elefantes em abril de 2012 em plena crise econômica, e após a alteração do artigo 135 da Constituição para garantir o pagamento da dívida; a cobrança de uma comissão por cada barril de petróleo importado, graças ao bom relacionamento com o monarca saudita; o escândalo do cunhado de Felipe VI, Iñaki Urdangarín e a infanta Cristina no caso Nóos; o caso Corinna e sua ameaça de denunciar o monarca e o ex-diretor do CNI (Centro Nacional de Inteligência) por ameaças e assédio; as duas fundações, Zagatka e Lucum, sob suspeita na Suíça relacionadas com o Rei emérito e que nomeia como beneficiários a seus três filhos, … são alguns dos exemplos de que não estamos diante de um caso isolado da corrupção pessoal de um monarca, mas diante de um sistema construído sobre uma corrupção estrutural e generalizada de um capitalismo espanhol atrasado.

Por: Antonio R.
Enquanto tudo isso vinha à tona, houve muitas tentativas para blindar à família Borbón e restabelecer o prestígio dessa instituição, com todo o aparato político-judicial necessário, bem como com o silêncio e cumplicidade por parte de alguns meios de comunicação.
Um exemplo disso foi à abdicação de Juan Carlos I em junho de 2014, promovida pela classe dominante para tentar combater a falta de legitimidade de um regime desafiado por uma crise econômica que começava a mostrar sua cara em 2008 e uma maré de protestos que vinham acontecendo desde 2011: 15M, as greves gerais, as Marés cidadãs, as Marchas da dignidade em 2014 ou a luta do povo catalão.
Com isso, tratava-se de limpar a imagem da instituição e sustentar a legitimidade de Felipe VI. Nesse sentido há que destacar o importante papel da burguesia tentando preservar a figura de Felipe VI como solução política de emergência no caso de que o descontentamento social colocasse em risco a continuidade de seu sistema de dominação.
No entanto, e embora num primeiro momento essas decisões pudessem servir de bálsamo para a instituição recuperar o brilho perdido, a cada dia fica mais difícil convencer ao povo que a corrupção e os escândalos do emérito, nada têm nada a ver com a atual instituição e fazem parte do passado. O atual monarca continuou perdendo apoio nos últimos anos, a ponto da pandemia do coronavírus ter contribuído para piorar sua imagem pública.
Ainda está muito recente o estrondoso panelaço em 18 de março passado ouvido nas varandas de quase todas as cidades do Estado espanhol, enquanto Felipe VI, em rede nacional, falava a todo o país. Uma reação que deixou evidente a indignação e a rejeição à instituição monárquica, enquanto o país enfrentava os piores dias de uma pandemia que já custou milhares de vítimas e deixa um panorama trabalhista e econômico de consequências incalculáveis.
O discurso do monarca não teve nenhuma menção ao seu pai e à cifra multimilionária que ele acumulou em contas bancárias secretas. Um dinheiro, que a promotoria suíça continua investigando, e que aparentemente foi recebido pela Arábia Saudita como “doações” pela ajuda que o rei emérito prestou nas gestões do país árabe com empresas espanholas e pela redução do preço de determinados serviços destas.
Felipe VI, o PSOE, PP e Vox ao resgate da Monarquia
Felipe VI foi obrigado a tomar a medida cosmética de declarar que renunciava à herança de seu pai, Juan Carlos I, bem como retirar a exorbitante quantia anual de 194 mil euros recebida por Juan Carlos I. Como citaram alguns meios de comunicação alternativos, salvar à Monarquia bem merece “matar o pai”, embora isso também não seja suficiente para acalmar os ânimos, já que não deixa de ser uma maneira de reconhecer abertamente a natureza criminosa das atividades de Juan Carlos I.
Também não ajudou muito que a maioria da Mesa do Congresso dos Deputados, constituída pelo PSOE, PP e Vox vetasse, em 10 de março, a criação de uma comissão de investigação sobre a fortuna de Juan Carlos I de Borbón, numa tentativa absolutamente miserável de encobrir um novo escândalo. Ou o giro do Podemos, uma formação que se declara republicana, respeitando à Monarquia afinando sua mensagem assim que surge a menor oportunidade. Em um recente discurso no Congresso Pablo Iglesias afirmou: “A Monarquia não está em crise, diz um republicano”.
Sua declaração não parou aí, ele também valorizou de maneira muito positiva o “catalão perfeito” que a Princesa Leonor demonstrou em seu primeiro ato oficial na Catalunha como herdeira, por ocasião dos Prêmios Princesa de Girona: “Acho que caiu bem na Catalunha escutar Leonor falando em catalão perfeito. É uma gentileza para com as pessoas que pensam e falam nessa língua”. E isso também se refletiu na sua avaliação da Mensagem de Natal feita pelo Rei. “Diante de um Felipe VI que em 2017 decidiu unir seu destino às direitas, acho que ontem vimos um chefe do Estado que se retificou parcialmente, que moderou seu discurso e que de alguma forma demonstrou ter um melhor olfato político do que tinha naquela época”, nas palavras de Pablo Echenique (porta voz do Podemos no Congresso dos Deputados, ndt).
E por último, o comunicado de imprensa patético e vergonhoso que a Casa Real transmitiu tentando explicar os fatos. Uma mensagem que ampliou a sensação de que a Casa Real tentava zombar das/os cidadãos e deixou patente a cumplicidade de Felipe VI na pilhagem obtida em anos de delitos.
As pesquisas dão as costas à Monarquia
Atualmente, as pesquisas sobre essa instituição voltaram e não é a primeira vez que o resultado reflete a queda na avaliação da coroa. Inclusive está abaixo da Igreja Católica e dos políticos. E tudo isso, apesar de, no congresso o PP ter nomeado como figuras mais relevantes da luta contra o coronavírus membros da Monarquia, da polícia, da polícia civil, do exército e até mesmo Amancio Ortega (magnata espanhol, fundador da Inditex, dona da rede de lojas Zara, ndt).
Já está muito distante daquela avaliação marcante que ele obteve em janeiro de 2018 (superando os anos dourados do rei Juan Carlos na década dos 90), em plena crise catalã, quando Felipe VI converteu seu discurso na televisão (em 3 de outubro de 2017), em uma autêntica declaração de guerra.
A pontuação que Felipe VI obtém entre as/os espanhóis se encontra em franca queda. Comparada com o expressivo (7,3 em 10) que alcançou em janeiro de 2018, sua pontuação caiu. Fevereiro de 2020, é sem dúvida, um ponto de virada com um 6 em 10. A partir daí, a queda continuou acentuando no mês de março com o decreto do Estado de Alarme, onde a nota alcançada foi de 5,6 e agora com a primeira reprovação ao seu reinado (4,8 em 10) durante este mês de abril, de acordo com a última pesquisa realizada pela SocioMétrica para o jornal El Espanhol.
Infelizmente, não podemos contrastar estes dados com os do Centro de Pesquisa Sociológicas (CIS, na sigla em espanhol) porque, apesar das promessas do atual Governo, o instituto sociológico contínua sem perguntar as/os cidadãos sobre essa instituição. Para saber sobre os dados mais recentes, temos que nos remeter ao ano de 2015, quando a Coroa obteve 4,4 sobre 10, embora Felipe VI tenha conseguido 52,8% da aprovação dos espanhóis à sua gestão. Agora, com a queda de popularidade, estes dados podem ter sido atingidos sensivelmente.
Romper com uma estrutura institucional e econômica herdada da ditadura
Não é de estranhar o descrédito e o crescente distanciamento de uma instituição salpicada de numerosos escândalos e que, em um momento tão dramático como o que estão sofrendo milhares de famílias no país, ouse comparar a miséria e os desconfortos do confinamento, mostrando nas telas de televisão às princesas dizendo “estamos, como milhões de crianças, há mais de um mês em casa e sem ir à escola por causa dessa pandemia, tentando continuar a vida da melhor maneira possível”. Um verdadeiro insulto e despropósito, que provocou imediatamente indignação e fez com que as redes sociais se enchessem de comentários sobre a comparação absurda de enfrentar o confinamento na Zarzuela (residência da família real) com a forma como vivem e sofrem os filhos e filhas da classe operária.
E, chegando a esse ponto, à classe trabalhadora não tem outra saída que impor um plano de choque social e sair às ruas para exigir um Plano de resgate as/os trabalhadores e o povo. Por isso, hoje é mais necessário e urgente do que nunca acabar com uma instituição parasitária como é a Monarquia. Recentemente, milhares de pessoas assinaram uma petição na plataforma “Change.org” para que o rei emérito “transfira todo o dinheiro que tem nas empresas off shore” para o ministério da Saúde. A falta de meios e de dinheiro é um dos mantras mais repetidos durante a pandemia do Covid-19. No entanto, fica absolutamente demonstrado que, com o dinheiro do orçamento da Casa Real e os mais de 2 bilhões da fortuna de Juan Carlos I, poderiam ser comprados milhões de máscaras e respiradores em um momento de emergência social como o que vivemos. Como já dissemos tantas vezes, não falta dinheiro, sobram ladrões e corruptos.
Nós, trabalhadores, precisamos romper com esta estrutura institucional e econômica que herdamos da ditadura franquista. É hora de decidir se queremos Monarquia ou República. Se queremos manter o status quo ou queremos abrir um processo constituinte, de protagonismo operário e popular, que eleja uma Assembléia Constituinte para redigir uma nova Constituição que garanta o pão, trabalho, teto e igualdade, as aposentadorias, os direitos sociais e as liberdades democráticas. Esta é uma das tarefas que temos pela frente.
Não é apenas a corrupção de um monarca, é a corrupção de um sistema
Outras operações especulativas do capitalismo espanhol onde interveio a mão de Juan Carlos I:
*A trama Gürtel.
*O caso Malaya.
*A especulação urbanística na República Dominicana.
*A venda do Banco Zaragozano, propriedade dos renomados financeiros Alberto Cortina e Alberto Alcocer, ao Barclays Bank em 2003.
*A construção da AVE à Meca levada a cabo por um consórcio de empresas espanholas encabeçadas pela OHL, etc.
Tudo isso serviu a Juan Carlos I e sua família para acumular uma fortuna que, segundo o jornal New York Times, está perto de 2 bilhões de euros.
Tradução: Rosangela Botelho

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