qui mar 28, 2024
quinta-feira, março 28, 2024

Medidas contra o coronavírus, lucro contra saúde, classe contra classe.

Enquanto o mundo é atormentado por uma epidemia viral sem precedentes nos últimos anos, vemos medidas grotescas por parte dos diferentes Estados, gerenciando essa crise melhor ou pior, mas sempre “à moda capitalista”.

Por: Javi Chinaski
No Peru, acabaram de eximir de qualquer responsabilidade os militares que reprimam ou matem civis durante suas patrulhas de quarentena [1]. As declarações de Trump e Bolsonaro dos últimos dias podem ser resumidas como: “todos ao trabalho, e se você ou seu avô morrerem, problema seu”. Na Itália, fizeram uma greve geral, depois de greves pontuais e selvagens, para fazer os empresários cederem e fecharem os locais de trabalho de produção não essencial. Na Inglaterra, a falta de material é tal que uma empresa de roupas eróticas/fetichistas doou todas as suas ‘trajes de saúde’ ao NHS (serviço nacional de saúde) [2].
Na Espanha, tarde, muito tarde e depois de não isolar as áreas mais afetadas porque “o vírus não entende fronteiras”; por fim se limita o trabalho não estratégico, ainda que seja feito de qualquer jeito com a comoção da patronal, como se as grandes empresas não tivessem recebido mais dinheiro do (seu) governo. Exemplos de situações escandalosas como essas, infelizmente, temos muitas passando pelos famosos naif e sua #FicoNaMinhaMansão, a cara de pau de grandes empresários por meio de esmolas para hospitais, abusos policiais … Mas não deixe que as árvores nos impeçam de ver a floresta.
O Estado enfrenta a crise com um critério de classe, de sua classe.
São nos momentos de crise como esses que o sistema econômico mostra sua incapacidade para enfrenta-los. Vemos isso em cada crise comercial, no estouro de toda grande bolha econômica e em toda grande recessão. Como Marx dizia, “o governo do estado moderno nada mais é do que um conselho que administra os negócios comuns de toda a classe burguesa.”
Os governos não estão apenas enfrentando o problema da epidemia, eles estão enfrentando o problema que essa crise significa para a classe burguesa. Disso resultam os confinamentos parciais enquanto os profissionais da saúde solicitam mais rigidez, a manutenção da produção, enquanto faltam equipamentos médicos; e as medidas econômicas para que sua classe não sinta. Alguma migalha virá para que a segregação não seja tão descarada e para tentar apaziguar a explosão social que está por vir, embora não precisamos ser um esperto para ver que somos os de sempre os que estamos pagando por isso, e eles vão querer nos fazer pagar mais.
No entanto, pode ser confuso que alguns países estejam levando o confinamento mais a sério do que outros, que alguns têm testes rápidos de CoVid-19 e outros não, mais ou menos material médico, etc …
Para além das medidas concretas que cada governo está tomando, da situação do sistema de saúde, do nível de contágio, a posição de cada país na cadeia produtiva mundial ou a capacidade de ativar medidas de economia planificada (ou “economia de guerra”), etc … todos seguem um critério comum.
Novamente: os governos não estão apenas enfrentando os problemas da epidemia, eles estão enfrentando o problema que esta crise representa para a classe burguesa. Países onde aparentemente são tomadas medidas “mais progressistas” o fazem cientes da grande concessão que estão fazendo aos trabalhadores e do quão necessárias são essas medidas para que elas suavizem o impacto e retornem a (sua) ‘normalidade’ o quanto antes. É o que ouvimos em inúmeros discursos, “que passe logo”, “poder retornar às nossas vidas”, “retornar à normalidade”. Mas que normalidade? Bem, a normalidade de sempre, a de se afundar na precariedade do trabalho, a de ver como as multinacionais são salvas com os impostos dos trabalhadores e com o discurso triunfante do presidente da vez, porque “todos nós saímos juntos disso”. Sim, todos juntos; mas a maioria dos trabalhadores pisoteados. A normalidade deles é a nossa crise.
O atual confinamento não é o que precisamos
É óbvio que, com a sangria das mortes e o ritmo de contágio do vírus, o confinamento da população é necessário. Mas existem maneiras e maneiras de fazer isso. Passamos duas semanas com uma caricatura de confinamento, com trens lotados de pessoas que vão trabalhar, escritórios e fábricas onde não havia insumos para atender às recomendações de saúde. Nenhuma limitação de trabalho não essencial, distâncias de segurança ou EPIs.
Chegamos ao extremo de ter que lamentar as mortes por coronavírus em setores como o telemarketing, onde o teletrabalho é perfeitamente viável [3]. Nos locais de trabalho em que houve luta, obteve-se uma vitória e o trabalho foi suspenso ou conseguiram que fosse realizado de maneira segura para os trabalhadores e suas famílias, como na Balay de Zaragoza ou na Mercedes-Benz de Gasteiz. Existem maneiras e maneiras de fazer um confinamento: para frear as perdas empresariais e proteger lucros ou frear a propagação do vírus e proteger a saúde.
O confinamento que os trabalhadores precisam pode ser melhor do que está sendo aplicado. Pense por dois minutos. Somente o trabalho essencial (realmente essencial, não as novas medidas tímidas desta semana), retirar da produção os trabalhadores dos grupos de risco, aplicar estritamente recomendações de saúde em locais de trabalho que continuam funcionando, limpeza e desinfecção do lugar de trabalho entre turnos, evitar o contato entre turnos diferentes, garantir proteção para todos os trabalhadores, etc … é viável.
Material médico e livre mercado
Em maior ou menor grau, todos os Estados têm problemas com reservas de máscaras, respiradores e insumos médicos. Mas os defensores do livre mercado nos dizem que podemos comprar tudo o que necessitamos, só precisamos de mais dívida e ir às compras por atacado. Receita infalível, vamos ver como realmente funciona:
Attilio Fonatana, presidente da Lombardia pela a Lega Nord: “Não foi nada agradável percorrer o mundo procurando equipamentos e respiradores, eu garanto. Há mais bandidos do que se pode imaginar: pessoas que especulava e tentava nos roubar, alguns que disseram que tinham o que não podiam fornecer. Nós encontramos uma falta de humanidade incrível [4].”
Ludo Splingaer, diretor do hospital de Antuertpia sobre a compra de máscaras no mercado: “No final elas não vieram da China, como diziam, mas da Colômbia. Foram embaladas em caixas usadas, de bananas e cereais de milho, o que é o oposto dos regulamentos. Em uma caixa, encontramos excrementos de animais [5].”
A presidenta da Comunidade de Madri, Isabel Díaz Ayuso, reconheceu que não sabe onde estão os dois aviões carregadas com insumos de saúde no valor de 47 milhões de euros [6].
Nem tudo são roubo, golpes e bandidos. Também temos empreendedores visionários que em janeiro compraram empresas de suprimentos médicos para aproveitar o aumento da demanda que o vírus na China, começava a mostrar. Eles veem na produção de material médico um investimento suculento e vão com tudo porque as pessoas estão morrendo e eles sabem que vão vender sim ou sim. Por outro lado, temos empresas que decidem converter sua linha de produção para insumos de saúde, evitando assim uma suspensão ou outras medidas e continuam tendo um produto para vender para garantir seu lucro.
Um bom exemplo para ver como eles estão aplicando esse parâmetro são as queixas dos empresários do setor, frente à produção altruísta de material médico, como se fosse “concorrência desleal” fazer algumas máscaras que não temos e que são necessários para salvar vidas. Isso aconteceu em Múrcia, após denúncias da patronal de empresas de equipamentos de proteção interromperam a produção altruísta que pequenas empresas estavam fazendo [7]. Não há um pingo de solidariedade ou humanidade, apenas negócio.
Solidariedade, iniciativas dos de baixo e a necessária auto-organização operária
Entre os de baixo, vemos como a comunidade maker e de hardware livre se organizam para fabricar respiradores caseiros e as costureiras aposentadas unindo esforços para costurar máscaras em casa [9]. Desde o primeiro dia do Estado de Alarme, os vizinhos estão se organizando para ajudar os idosos na compra e organizando redes de solidariedade. Todas essas iniciativas são tão valiosas quanto necessárias, mas não são o suficiente. Precisamos dessas e muito mais, mas precisamos fazê-las com todos os recursos ao nosso alcance e esses recursos são nossos locais de trabalho. As melhores máquinas para costurar máscaras, para fabricar respiradores e medicamentos está em nossos locais de trabalho. É necessário que os trabalhadores organizem a produção de acordo com nossas necessidades de saúde, enfrentando a patronal e o Estado.
Essa auto-organização é a última coisa que eles querem que aconteça. O altruísmo individual está indo bem para eles. Os aplausos de antes do jantar e as histórias meigas de vovós costureiras dizem muito e bem das pessoas que o fazem, mas o governo usa esses exemplos para encobrir os problemas de fundo.
Grandes camadas da população estão vendo quais são os trabalhos essenciais: enfermagem, transportadores, indústria pesada, produtos químicos, assistência médica domiciliar, caixas, repositores, depósitos, diaristas … os mal pagos, muitos dos quais ouvem falar de “ter estudo”.
Agora nosso dia a dia está nestas mãos. Bom, sempre foi, mas agora é mais do que evidente. Se além desse despertar da consciência, organizamos a produção e, sem permissão, gerenciamos o serviço da crise de saúde, as máquinas e os meios de produção que nunca deveriam ter sido de poucos, eles nunca vão nos perdoar. Pois que não nos perdoe. Que, por hora, nos conformamos que as pessoas de nossos bairros parem de pagar o pato, e serem os que morrem.
Notas:
[1] https://www.clarin.com/mundo/coronavirus-peru-eximen-militares-policias-responsabilidad-penal-
reprimir-cuarentena_0_FXvgjMkrA.html
[2]  https://metro.co.uk/2020/03/28/medical-fetish-site-donates-entire-stock-scrubs-nhs-12469788/
[3]https://www.elsaltodiario.com/coronavirus/sindicatos-denuncian-muerte-teleoperadora-covid-urgen-teletrabajo-konecta-telemarketing-teletrabajo
[4]https://elpais.com/sociedad/2020-03-30/el-presidente-de-lombardia-intentaron-estafarnos-al-comprar-material-esta-lleno-de-bandidos.html
[5]https://elpais.com/sociedad/2020-03-30/el-presidente-de-lombardia-intentaron-estafarnos-al-comprar-material-esta-lleno-de-bandidos.html
[6]https://www.elplural.com/autonomias/gobierno-ayuso-teme-estafa-238-millones-euros-aviones-falsos-china_236786102
[7]https://www.ondacero.es/emisoras/murcia/murcia/audios-podcast/informativos/empresas-yecla-detienen-fabricacion-altruista-mascarillas-queja-patronal-asepal_202004015e8453d1e70eb30001511ceb.html
[8]  https://www.eldiario.es/sociedad/Medicos-ingenieros-disenadores-soluciones-
coronavirus_0_1005799696.html
[9]https://elperiodicodevillena.com/avalancha-de-solidaridad-para-coser-mascarillas-destinadas-al-hospital-de-elda/
Tradução: Vitor Jambo
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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