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sexta-feira, março 29, 2024

Cuba| A resposta do governo cubano dá ainda mais legitimidade aos protestos

As mobilizações ocorridas na ilha a partir de 11 de julho e a resposta do governo cubano são acompanhadas com extrema atenção na América e em todo o mundo. A ditadura respondeu desde o início com repressão, chamando às ruas seus grupos de choque para atuarem em conjunto com as Forças Armadas do regime, medida que deixou centenas de detidos e pelo menos uma morte confirmada.

Por: Pablo Bordon

No entanto, apesar da campanha inicial que procurou confundir o legítimo protesto popular – que ocorreu contra a fome, a crise da saúde e a falta de liberdades democráticas mínimas – com um movimento pró-imperialista, o governo cubano mostrou contradições evidentes. Enquanto um coro de defensores de “esquerda” do regime negava qualquer legitimidade ao protesto social, o próprio presidente não conseguia tapar o sol com as mãos. Assim, o próprio Diaz-Canel teve que admitir, pelo menos parcialmente, que muitos dos manifestantes “são pessoas insatisfeitas. Têm possibilidades de mostrar suas insatisfações de outras maneiras, mas escolheram esta. Legítimo também porque têm aspirações e insatisfações, nem sempre receberam atenção adequada ”[1].

Perguntamo-nos: não eram unicamente mercenários, vermes pagos pelo império? Fatos como esse mostram que esse discurso pode servir para ser utilizado pelos cúmplices do regime, mas a própria pressão do povo nas ruas o joga por terra e o obriga a reconhecer, ainda que de forma limitada, a justeza das reivindicações. Evidente que em seguida voltam a agitar o fantasma de que tudo é uma conspiração imperialista. De qualquer forma, declarações como essas, na boca de qualquer ditador ou governo totalitário, são impensáveis ​​sem que os fatos sejam impossíveis de esconder inteiramente.

Por outro lado, as prisões de algumas figuras reconhecidas, opositoras do governo, e impossível de qualificar de pró-imperialistas, como Frank García Hernández, historiador e marxista cubano; Leonardo Romero Negrín, um jovem socialista que estuda física na Universidade de Havana; Maykel González Vivero, diretor da Tremenda Nota; e Marcos Antonio Pérez Fernández, pré-universitário; Frank García Hernández, importante acadêmico de esquerda, provocaram um forte apelo unitário de vários setores democráticos e de esquerda que acabou conseguindo a libertação parcial dos mais reconhecidos, embora ainda persista um número de presos difícil de precisar.

As novas medidas dão motivo para quem foi às ruas

O governo, que vinha dizendo que todos os males eram obra exclusiva do bloqueio e da pandemia, negando qualquer responsabilidade própria na aplicação de medidas de ajuste para fazer o povo pagar pela crise como fazem todos os governos capitalistas, fez uma série de anúncios, pressionado pelos protestos [2]. Algumas são concessões mínimas, que, acima de tudo, não fazem mais do que demonstrar a legitimidade dos próprios protestos.

Dada a evidente falta de medicamentos essenciais, o governo autorizou a entrada ilimitada através de viajantes, supostamente sem fins comerciais. Assim, mostram que, para além do bloqueio, a entrada desse tipo de produto é possível, desde que haja autorização governamental. Medidas semelhantes seriam tomadas com alimentos e produtos de higiene.

Obviamente que a burocracia pútrida do Partido Comunista Cubano (PCC), temendo que o cassetete não bastasse para conter os protestos, também teve que usar a concessão. Embora do ponto de vista das necessidades do povo cubano, essas medidas não signifiquem uma solução substantiva, são um tapa na cara para todo o coro de organizações que negaram a legitimidade das reivindicações levantadas por aqueles que saíram para protestar.

No entanto, ao mesmo tempo em que o regime anuncia essas medidas para aliviar as pressões de baixo, aprofunda outras que visam continuar a favorecer os empresários privados.

Entre outros anúncios “o ministro da Economia, Alejandro Gil, explicou que se “chegou a um consenso para eliminar as obrigações de utilizar a escala salarial na empresa estatal” com a qual as empresas podem “administrar seu fundo de salário” [3], uma medida que se apresenta como um incentivo para aumentos salariais, mas que abre a porta para reduções que não respeitam nem mesmo uma escala mínima.

A partir daí avançam, em meio à verborragia confusa, na típica produtividade burguesa e flexibilidade laboral e salarial, explicando que “Não é que o salário seja livre, podemos ganhar o que for, mas existe um fundo de salario, um compromisso com o dono e uma utilidade a cumprir, então segue-se o mesmo princípio de que se ganha mais quanto mais se gera riqueza, quanto mais eficiente se é … sob um padrão de razoabilidade, com sentido econômico e levando em consideração a forma na que opera nossa economia”[4]. O problema está em um “detalhe”: quem se apropria da riqueza produzida em uma economia voltada para a geração de lucros? Assunto esquecido pelo ministro.

Entre as reformas previstas, avança-se também na entrega de empresas estatais e mistas a proprietários privados, como explica o ministro ao afirmar que “Embora a micro, pequena e média empresa privada tenha um proprietário que é pessoa física, no caso da micro, pequena e média empresa estatal, o proprietário é o Estado, que é representado por pessoa jurídica”. Entre as alternativas valorizadas, disse, “estão as unidades orçamentadas, empresas ou Organismos Superiores de Gestão Empresarial e também centros científicos e universidades que podem atuar como sócios ou proprietários de micro, pequenas e médias empresas estatais” [5].

Fortalecer o protesto e rodear com solidariedade

Para o povo cubano, nenhuma solução sairá das mãos da burocracia governante que restaurou o capitalismo e hoje aplica os ajustes contra o povo da ilha, nem das ilusões que os oportunistas pró-imperialistas estão tentando levantar.

A LIT-QI acredita que a única solução definitiva virá de uma nova revolução socialista, que desta vez colocará o poder nas mãos do proletariado, lutando contra toda a burocracia e exercendo a democracia operária.

Sabemos que com muitos companheiros e companheiras não temos acordo total ou parcial sobre esta saída fundamental. Mas, enquanto continuamos o debate, fazemos um chamado a todos aqueles que estão a favor do direito do povo cubano a se mobilizar por suas reivindicações, que manifestem solidariedade com os protestos e exijam a liberdade de todos os presos por lutar.

Notas:

[1] Veja: http://www.cubadebate.cu/noticias/2021/07/14/diaz-canel-y-dirigentes-del-gobierno-comparecen-en-la-mesa-redonda-video/#anex- 1581051

[2] http://www.cubadebate.cu/noticias/2021/07/14/diaz-canel-y-dirigentes-del-gobierno-comparecen-en-la-mesa-redonda-video/#anex-1581023

[3] Veja: https://www.notimerica.com/politica/noticia-cuba-cuba-autoriza-excepcionalmente-viajeros-importacion-alimentos-medicamentos-limites-aranceles-20210715015157.html

[4] Idem

[5] Veja: http://www.cubadebate.cu/noticias/2021/07/14/diaz-canel-y-dirigentes-del-gobierno-comparecen-en-la-mesa-redonda-video/#anex- 1581059

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