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sexta-feira, março 29, 2024

Cresce a vigilância e o controle sobre os trabalhadores

Como estamos denunciando em alguns artigos, muitos governos vêm se aproveitando da catástrofe que está ocorrendo em nosso planeta para aumentar a repressão e controle sobre os trabalhadores, se preparando para os próximos enfrentamentos sociais.

Por: Asdrúbal Barbosa
Institutos que medem a democracia no mundo como o V-Dem (Instituto de Variações da Democracia)[1], da Suécia, concluíram que atualmente a maior parte dos países do mundo são governados por regimes autoritários ou ditatoriais, uma dinâmica que deve aumentar com a pandemia de coronavírus. Os exemplos emblemáticos foram as recentes mudanças na Hungria e na Polônia.
Mesmo nos Estados onde não existe uma mudança qualitativa, elas são importantes no sentido de limitar a democracia para os trabalhadores. Com o cerceamento da liberdade de informação, a liberdade de reunião e o direito de greve. Aproveitando-se da justificativa da real necessidade do isolamento social os governos restringem a liberdade de ir e vir e o direito de protestar, principalmente porque o movimento de resistência, aos fortes e profundos ataques que estão sendo feitos ao nível de vida dos trabalhadores, tem que ser feito nas ruas, com protestos e manifestações.
Basta ver que houve uma diminuição das manifestações em países onde os governos estavam na berlinda, como Sudão e Chile. No Chile em particular Pinera quer se aproveitar da pandemia para sufocar a revolução e eliminar uma parcela da vanguarda na carceragem chilena.
Estes setores da burguesia acreditam que o descontentamento com a crise na saúde pública e com a crise econômica, que vai acompanhá-la, e vai aumentar, pode levar a explosões sociais, que devem ser combatidas com mais repressão.
Os trabalhadores não podem aceitar as cantilenas patronais e, ao contrário, devem aproveitar esta situação difícil que estamos vivendo para investir na nossa auto-organização e em tudo que fortaleça nossa luta para realizar uma profunda transformação na sociedade na perspectiva de uma sociedade socialista.
Monitorando as redes sociais          e os celulares
Causou surpresa em algumas organizações a ministra de Seguridad Sabina Frederic, do governo Alberto Fernandez na Argentina, considerado por alguns como uma ala mais progressista da burguesia, confirmar que seu governo está realizando a “ciberpatrullaje” sobre a população, no marco do isolamento social preventivo e obrigatório, decretado pelo governo. Esta “patrullaje” é feita nas redes sociais para “detectar o humor social”, ante as supostas ameaças de saques. Os agentes do Estado monitoram as contas de Twitter, Facebook e Instagram. Transformando todos os argentinos em suspeitos, passando a segui-los como criminosos, invadindo a privacidade dos trabalhadores. A prática de vigilância estatal, já vinha sendo aplicada durante o governo de Mauricio Macri, com a tristemente lembrada ministra Patrícia Bullrich. Hoje é aplicada pelo governo dos Fernandez, que vem se caracterizando por um aumento importante da violência e abuso policial (54.174 denúncias desde o início da pandemia), dentro de sua estratégia de vigilância social e “controle de quarentena” que já levou a mais de 100 mil pessoas a serem detidas ou paradas para averiguação de acordo com o decreto DNU 297/202.[2]
Além das redes sociais vários países, estão utilizando os GPS[3] embutidos nos celulares para monitorar a movimentação das pessoas. Utilizando a chamada “tecnologia de geolocalização[4] Estes dados são controlados por empresas como Google (Google Maps), Facebook (WhatsApp) e o Instagram, que armazenam os deslocamentos e guardam um histórico dos trajetos ou locais visitados pelos seus usuários. Com isso criam índices de deslocamentos que podem fornecer aos governos. Recentemente estes dados se materializaram no “Relatório de Mobilidade da Comunidade“, composto de 130 países. A justificativa agora é ajudar no combate a pandemia do coronavirus, mas não há nenhuma garantia de que não sejam utilizados para outros fins.
Os riscos para os trabalhadores e os movimentos sociais são enormes. Implica em que seus ativistas e militantes estarão localizáveis e localizados quando os agentes do Estado quiserem. Governos usarão dados de localização para identificar seus opositores políticos e manifestantes que participam de protestos. O poder judiciário, o ministério público e a polícia usarão estas informações para localização e intimidação de seus perseguidos políticos. Inclusive grupos de ultradireita e de supremacistas brancos poderão violar servidores de uma startup para localizar e obter endereços residenciais de seus alvos.
Quando combinados com outros dados, obtidos em publicações nas redes sociais, informações fornecidas pelos provedores e inclusive os metadados (que podem ser conseguidos em imagens e vídeos enviados junto com arquivos), armazenados e analisados, serão um material de grande potencial investigativo nas mãos dos aparatos de repressão.
Em Hong Kong, enquanto os drones monitoravam os manifestantes filmando e tirando fotos, a polícia também utilizou um aplicativo que através dos smartphones recebia sinais que localizavam os ativistas. Os próprios manifestantes mostraram que isso era possível quando utilizaram um aplicativo de rastreamento de localização em tempo real para mapear as posições dos policiais, retirado da App Store da Apple.
O governo norte-americano também já tem domínio de aplicativos que utiliza para rastrear e identificar quem participa das manifestações e captar o conjunto de seus dados, identificando manifestantes, jornalistas e advogados do movimento.
Por isso, os governos da União Europeia querem construir um aplicativo pan-europeu, sob seu total controle, que possa rastrear as aglomerações e manifestações em todo subcontinente, a partir de compartilhar os dados da localização de telefones celulares. Participam deste operativo operadoras de telefonia, como Vodafone, Deutsche Telekom e Orange.
Em Israel, o governo de Binyamin Netanyahu utiliza-se do combate ao coronavirus para estender o sistema de coleta de dados de celulares chamado de “operações antiterrorismo” dos palestinos, para rastrear os telefones de toda população.
A Coreia do Sul, do Presidente Monn Jae-in, Partido Democrático, fez com que todos que entrassem no país, oriundos das regiões infectadas, baixassem um aplicativo no celular permitindo o monitoramento do estado, que combinado com os dados do cartão de crédito e reconhecimento facial nos espaços públicos para monitorar os passos de qualquer pessoa que estivesse no país.
No Brasil operadoras de telefonia: Claro, Oi, Tim e Vivo forneceram a localização de 222,2 milhões de linhas móveis para o Ministério da Ciência, Inovação, Tecnologia e Comunicação (MCTIC). Elas respondem por 97,8% dos 227,1 milhões de acessos móveis. O Facebook, que detém informações de mais de 2 bilhões de pessoas ao redor do mundo, 130 milhões no Brasil, também forneceu mapas. Tudo sem nenhuma autorização de quem tem suas informações confiscadas. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que buscaria estabelecer alguma regulamentação, obrigando as empresas a terem o consentimento explícito do usuário para coletar, armazenar e tratar os seus dados, teve sua vigência postergada pelo governo Temer para agosto de 2020, e atualmente um novo Projeto de Lei (1.179), aprovado na Câmara dos Deputados, para janeiro de 2021. Retirando a necessidade deste consentimento e dando ao governo carta-branca para expandir a vigilância digital.
Os governos anunciam que os dados vão ser utilizados para monitorar a mobilidade populacional “com as devidas garantias legais” e que os dados serão anônimos, apagados ou estarão disponíveis por tempo limitado. Mas ninguém acredita nisso.
Afinal a preocupação destes governos não é salvar vidas e sim combater os movimentos sociais.
Construíram inclusive o COVID-19 Disorder Tracker (CDT) que fornece uma cobertura especial do impacto da pandemia em todo o mundo e seus desdobramentos em violência política e protestos sociais, monitorando mudanças nas atividades populacionais, manifestações e demonstrações, repressão estatal, ataques de multidões, conflitos armados e quaisquer outros. De fato, o “Big Data”, que era domínio dos profissionais de marketing para elevar seus lucros estão se tornando um meio de aumentar a vigilância sobre a classe trabalhadora.
A referência é a ditadura chinesa
O sonho destes governos é chegar ao controle estabelecido pelo governo ditador da China que manipulou informações, prendeu e sumiu com opositores e depois exigiu que a população de Wuhan, devastada pelo coronavírus, demonstrasse gratidão ao Partido Comunista por conter a infecção. Depois fez uma correção e acrescentou 1290 mortes a mais nas que de fato tinham ocorrido, 50% a mais. “Um pequeno erro[5]
Aproveitando-se da crise desenvolveu mais ainda aplicativos de controle social. Com um software que envia dados pessoais do usuário diretamente à polícia. Aproveitando o já existente “Sistema de Crédito Social” que monitora o comportamento de todos os cidadãos e empresas, conferindo pontos positivos e negativos, como uma espécie de ranking de confiança do governo. Se leva multas de trânsito, desrespeita ordens judiciais, fuma em locais proibidos, acumula dívidas, recusa ingressar no serviço militar obrigatório ou posta notícias não autorizadas online, tem seus créditos reduzidos. As punições vão de restrições na compra de passagens de avião e trem, ao bloqueio de acesso a linhas de crédito, além de proibição da matrícula dos filhos nas melhores escolas e veto a um posto de trabalho em órgãos públicos.
Este aplicativo passou também a classificar os cidadãos com bandeiras verde, amarela ou vermelha, controlando onde e quando cada pessoa esteve. Abastecendo a polícia com informações pessoais dos usuários. Caso a pessoa receba uma bandeira amarela ou vermelha, deverá se isolar e realizar um check-up médico. Se os testes não encontrarem no paciente uma doença, como o Covid-19, a bandeira fica verde, e o cidadão pode re-ingressar em locais públicos novamente.
Analises no código fonte do software constataram que, logo após o usuário aceitar os termos e condições do aplicativo, seus dados, como nome, localização e número de documentos, são enviados às autoridades por meio de um arquivo, além de enviar os dados, toda vez que o aplicativo é escaneado sua localização é armazenada nos servidores do sistema, o que possibilita o rastreio dos percursos do cidadão.
Para completar o controle o governo formou os “grupos de vigilância de bairro” ou “batalhões de agentes da vizinhança”, voluntários uniformizados, representantes do Partido Comunista Chinês. Lembrando os tempos da revolução cultural de Mao Tsé-Tung. Nos complexos habitacionais eles emitem passes para regular a frequência com que os moradores deixam suas casas e controlam as visitas que são recebidas.
São os desenvolvimentos tecnológicos nas mãos da burguesia a serviço de aumentar a repressão sobre a classe trabalhadora aumentando o sistema de controle social.
Monitoramento de todos a serviço do estado burguês
Hoje os governos dizem que o aumento do monitaramento é para controlar a pandemia, no entanto sabemos que uma vez sob controle destes recursos os utilizarão para conter os conflitos que virão. Temos que ter claro que o estado na sociedade capitalista serve aos interesses dos empresários e banqueiros, da burguesia, e por isso não podemos aceitar que em nome no controle da pandemia ataquem os nossos direitos democráticos.
Em vários países os trabalhadores vão demonstrando que apenas a sua auto-organização poderá verdadeiramente conter a pandemia sem gerar uma crise social. Contra o monitoramento do estado temos que defender e implementar a nossa organização para lutar contra a pandemia, contra a crise social e contra o capitalismo, na luta revolucionária por uma sociedade socialista.
[1] https://www.v-dem.net/en/
[2] Según los datos de la Coordinadora Contra la Represión Policial e Institucional (CORREPI).
[3] (Sistema Global de Posicionamento)
[4]Onde se obtém a localização geográfica das pessoas através do smartphone e do sistema formado pela rede de satélites e fornecido através da triangulação dos sinais recebidos.
[5] A autora chinesa, Wang Fang, pseudônimo, Fang Fang, denunciou estes fatos no “Diário de uma Cidade Fechada”, um relato sombrio da vida e da morte em massa em Wuhan, no que ela considerada um “homicídio culposo”, pelas falhas do governo em responder à crise.

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