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quinta-feira, março 28, 2024

Com apoio de Bolsonaro, Amazônia volta a viver uma corrida pelo ouro

No último dia 6, o jornal “Folha de S. Paulo” publicou uma reportagem mostrando que, este ano, o general Augusto Heleno, Ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência, autorizou sete projetos de pesquisa de ouro na região de São Gabriel da Cachoeira (AM). A decisão foi tomada com base a projetos encaminhados pela Agência Nacional de Mineração (ANM).

Por Jeferson Choma

A região fica no noroeste do Amazonas, sendo conhecida como Cabeça do Cachorro. É umas das mais preservadas da floresta tropical, repleta de Terras Indígenas: há aproximadamente 23 etnias vivendo no local. A presença indígena é tão marcante que a região de São Gabriel é conhecida como a capital do nheengatu e de outras línguas de povos originários, como a dos Tukanos e Baniwas.

Desmatamento

Todas as áreas autorizadas pelo general são de terras da União, vizinhas às Terras Indígenas. Trata-se, portanto, de mais uma ação do governo Bolsonaro destinada a incentivar a mineração sobre terras públicas da Amazônia, sejam elas devolutas (sem destinação pelo poder público e que em nunca integraram o patrimônio de um particular), indígenas ou Unidades de Conservação.

Aliás, essa política criminosa resultou no desmatamento de 405,36 km² da Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e parte do Maranhão) nos últimos cinco anos, segundo dados do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe).

No que se refere às Unidades de Conservação, o desmate por mineração cresceu 80,62%, no primeiro trimestre de 2020, em comparação com o mesmo período do ano passado, de acordo com a ONG Greenpeace.

Genocídio dos povos da floresta

Além da floresta, os povos que vivem nela são as maiores vítima da expansão da mineração, que contamina rios, solos e pessoas, gera violência e desagrega comunidades tradicionais.

Os povos indígenas, particularmente, vivem sob a ameaça de um novo genocídio. Atualmente, mais de 3 mil requerimentos minerários sobrepostos a terras indígenas da Amazônia Legal tramitam na ANM. De acordo com o projeto “Amazônia Minada”, do InfoAmazonia, pelo menos 58 requerimentos de pesquisa ou lavra de minério foram aprovados pela agência, mesmo afetando terras indígenas, o que é proibido pela Constituição.

A mineradora Anglo American é dona de quase metade das autorizações feitas pela ANM, com 27 pedidos válidos de pesquisa de cobre em terras indígenas do Mato Grosso e do Pará. Seu principal alvo, com 13 pedidos, é a terra Sawré Muybu (Pimental), no sudeste do Pará, uma área tradicionalmente ocupada pelo povo Munduruku.

Invasão e contaminação

Há mais de 70 anos o povo Munduruku enfrenta a invasão da garimpagem em suas terras, localizadas no médio Rio Tapajós. Uma pesquisa, realizada pela Fiocruz em parceria com o WWF-Brasil, mostra que, como resultado da atividade garimpeira, 100% dos indígenas estão contaminados por mercúrio.

O povo Yanomami enfrenta a mesma situação em Roraima. Desde que Bolsonaro foi eleito, mais de 20 mil garimpeiros invadiram suas terras, assassinam indígenas e contaminam os rios e peixes. No entanto, o compromisso de Bolsonaro em promover o genocídio dessa população é tamanho que a Fundação Nacional do Índio (Funai) proibiu que pesquisadores da  Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) realizassem um estudo sobre a contaminação de mercúrio (ou seja, causada pela mineração) nos Yanomami.

Quem é quem na mineração da Amazônia

Garimpagem ou mineração ‘legal’: destruição, saque e morte

Hoje em dia, a garimpagem tem muito pouco em comum com o que ocorreu em outros tempos, como na década de 1970, em Serra Pelada. Naquele momento, Serra Pelada atraiu camponeses pobres, despossuídos e peões que trabalhavam em obras rodoviárias promovidas pela ditadura.

Depois, vieram os desvalidos do fim do chamado “milagre-econômico” e aventureiros de todas as partes. Por algum tempo, a própria ditadura fomentou o garimpo, querendo garantir a ocupação de terras na região e impedir a movimentação de guerrilhas.

Mas, atualmente, não é mais o garimpeiro quem financia a atividade ilegal. E ela não é mais realizada com picaretas nem reúne um “formigueiro humano”.  O garimpo na Amazônia está mais empresarial e desmata, contamina e degrada muito mais, a começar pelo uso de escavadeiras, tratores e maquinário pesado.

Um esquema criminoso

Além disso, quem financia a atividade são políticos, empresários, o crime organizado, quadrilhas de grilagem de terras e milícias que atraem trabalhadores, pessoas vulneráveis e corrompem lideranças comunitárias. São os líderes dessas quadrilhas que enriquecem, e não o garimpeiro que muitas vezes trabalha em condições análogas à escravidão (desde 2008, 333 trabalhadores em garimpos foram resgatados nessas condições).

Geralmente, a garimpagem está associada a outras atividades ilegais, como exploração da madeira, invasão de terras públicas, pecuária, tráfico de drogas etc. Ou seja, o garimpo ilegal é mais um capítulo da acumulação capitalista realizada na Amazônia, que hoje é palco de uma “territorialização miliciana”, realizada por grupos criminosos.

A destrutiva “legalidade” do capitalismo

Mas, há também a mineração “legal” capitalista, realizada na região por grandes indústrias, geralmente estrangeiras. Reza a lenda que elas seriam “menos predatórias”, pois teriam a autorização da Agencia Nacional de Mineração. O vazamento em barragem de rejeitos da empresa Hydro Alunorte, em dezembro de 2018, que contaminou cidades do Pará, com mercúrio, arsênio e chumbo, mostra que isso é uma farsa. Não há fiscalização e, como vimos, a mineração “legal” também invade terras indígenas.

Atualmente, as mineradoras pressionam pela flexibilização da legislação ambiental, como prevê, por exemplo, o Projeto de Lei 3729 em tramitação no Congresso Nacional, que propõe o fim do licenciamento ambiental. O projeto, já foi apelidado de “o pai de todas as boiadas” (em referência à famosa frase do ex-ministro Ricardo Salles).

Legal ou ilegal, a mineração na Amazônia representa a destruição e o genocídio dos povos indígenas, enquanto meia dúzia de criminosos – milicianos ou engravatados da Faria Lima (avenida que concentra o centro nervoso da burguesia, em São Paulo) – faturam bilhões com o roubo, o saque e a morte.

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