sex mar 29, 2024
sexta-feira, março 29, 2024

Entrevista com dois candidatos operários da II-SP

Antonio Rodríguez e Juan Ignacio Orengo são candidatos nas próximas Eleições Européias pela chapa de Iniciativa Internacionalista – A solidariedade entre os povos. Antonio Rodríguez é trabalhador da multinacional americana do transporte UPS e membro do Comitê de Empresa do centro de Vallecas pelo Sindicato Cobas. Juan Ignacio Orengo é metalúrgico, presidente do Comitê de Empresa de MP Componentes Mecânicos de Sevilha, Membro da executiva do sindicato provincial de Indústria e do Conselho da União Provincial e da Comissão Executiva do metal de CCOO [central sindical Comissões Operárias] de Sevilha, pelo setor Critico. Eles pertencem à lista dos que enfrentaram resolutamente o EREs [planos de demissões apresentados pelas empresas] e conseguiram barrá-las. Antonio e Juan Ignacio são militantes de Corriente Roja [1], em Madri e Sevilha.

 

Quem são os candidatos e candidatas de Iniciativa Internacionalista?

 

Antonio: Os candidatos de nossa chapa são trabalhadores comprometidos na luta contra o EREs, as demissões e as privatizações, jovens que têm estado à cabeça da luta contra o Plano Bolonha [2], intelectuais, artistas e profissionais sempre comprometidos com a defesa das liberdades democráticas e em especial com os direitos das nacionalidades, como Alfonso Sastre que é quem encabeça a chapa.

 

Como resumiriam em quatro ou cinco palavras suas propostas?

 

Juan Ignacio: Creio que se pode resumir dizendo: Aos trabalhadores: emprego, aos povos: soberania. Essas são as idéias base que queremos defender nesta campanha. Quando há mais de quatro milhões de desocupados no Estado espanhol e 25 milhões na Europa, a primeira medida de urgência para que nós trabalhadores não sejamos os que paguemos pela crise é começar pelo mais básico, a divisão do trabalho, a garantia de emprego para todos e o subsídio indefinido enquanto esse emprego não chega.

 

O Governo diz que a crise é internacional e eles não podem fazer mais do que estão fazendo.

 

Juan Ignacio: Aqui parece que a crise chegou de outro planeta, que nem os governos, nem os empresários, nem os bancos, têm responsabilidade alguma. Dizem que temos um modelo produtivo baseado no tijolo [3], na especulação. Mas quem decidiu esse modelo e o sustentou durante anos? Esse modelo é o que desenvolveu Aznar e manteve Zapatero; foram os bancos e as construtoras os que fizeram um bom negócio nesses anos de vacas gordas. Têm sido esses Governos e seus banqueiros os que espoliaram o solo, generalizaram o trabalho precário, provocaram o endividamento geral da população e espoliaram a América Latina. Assim foram construídas as grandes fortunas nestes anos.

 

Esta crise não veio de nenhum outro planeta, é a crise do sistema capitalista mesmo, de um sistema de produção para o lucro. A crise, portanto têm responsáveis, com nomes e sobrenomes, são o Botim, os Florentino Pérez, os Amancio Prada, as Koplovich,… E os que como Aznar antes e Zapatero agora governaram para eles.

 

Antonio: Além do mais, de que proteção social falam? Enquanto os banqueiros enchiam os bolsos nestes anos, os trabalhadores foram perdendo direitos e mantendo seu nível de vida a base de hipotecar-se. Agora que chegou a crise para muitas famílias o desemprego é sinônimo de perder tudo incluindo a moradia. Há mais de um milhão de lares onde ninguém tem trabalho nem recebem auxílio algum. De que proteção social alardeia então o Governo?

 

Quando o Governo Zapatero assumiu e gerou muitíssimas expectativas entre os trabalhadores e a população em geral, desde Corriente Roja dizíamos que este Zapatero não tinha vindo fazer sapatos para os pobres senão a lustrar aos “Botines”. A vida ditou a sentença. O único apoio claro tem sido o que o Governo está dando aos banqueiros. Milhões de Euros para o Sistema Bancário e milhões de trabalhadores ao desemprego, esse é o verdadeiro estilo do Governo.

 

Mas a patronal e o PP [Partido Popular, opositor de direita] atacam também a Zapatero…

 

Juan Ignacio: Para ser preciso, um setor da patronal e seu representante político o PP. A crise tem desencadeado também a divisão entre os capitalistas. Nem para todos os empresários a crise é igual.

Há um setor que busca mais reformas trabalhistas para baratear as demissões, salários e direitos a todo custo. Mas há outro, o mais poderoso, que é o sistema bancário e as multinacionais, que recebem fortunas do erário público que lhes dá o Governo Zapatero. À medida que avança a crise põe-se mais em evidência que este é o Governo dos banqueiros.

A crise de 29, da que tantas analogias se fazem, durou 10 longos anos e provocou um fechamento generalizado de empresas, o desemprego em massa, milhões de trabalhadores foram lançados à pobreza e o capital só saiu dela com uma guerra mundial e em base à reconstrução de um continente, a Europa que ficou completamente devastada. Como vão sair desta vez da crise?

Hoje não há lugar para uma nova guerra mundial, porque o domínio militar do imperialismo ianque é indiscutível. Para eles, a saída da crise é desencadear uma verdadeira guerra social contra os trabalhadores e os povos, impor um brutal retrocesso nos direitos, cortes salariais, dos serviços públicos e conquistas sociais como as pensões. Só assim a burguesia busca recuperar a taxa de lucro para voltar a investir e iniciar um novo ciclo de crescimento.

 

CCOO e UGT dizem que os que defendem a greve geral querem utilizar aos trabalhadores de infantaria contra o Governo. Qual a opinião de vocês quanto a isso?

 

Antonio: Os dirigentes de CCOO e UGT em lugar de defender aos trabalhadores converteram-se em uma das grandes pontas de lança do Governo e do sistema. São os grandes propagandistas de que “a crise é internacional”, isentando ao Governo e à patronal, com quem vivem anos de paz social, da responsabilidade nesta crise. Mais de quatro milhões de desempregados; existem cada vez mais famílias sem trabalho nem subsídio, EREs por todos os lados e eles dizendo que não há razões para uma Greve Geral e que há que sair da crise unindo forças com a patronal e o governo, “que todos apertemos o cinto”, como se todos tivéssemos a responsabilidade pela crise e a sofrêssemos da mesma maneira.

CCOO e UGT converteram-se em verdadeiros cúmplices das demissões em massa de trabalhadores via a assinatura de EREs. Basta como dado que mais de 90% dos EREs são acordados. Eles querem converter aos trabalhadores nos “peregrinos” do Governo dos banqueiros em seus litígios com o PP e os setores patronais que representa.

 

Em sua opinião que medidas deveriam ser adotadas frente ao desemprego?

 

Juan Ignacio: Nós vimos defendendo a necessidade imperiosa de um plano de resgate dos trabalhadores. Dizemos que a luta contra o desemprego é hoje a primeira tarefa de todos os trabalhadores, dos que têm trabalho (e não sabem até quando) e dos que estão desempregados. Que se reparta o trabalho existente entre a mão de obra disponível. Que se reduza a jornada de trabalho, sem reduzir o salário, para trabalhando menos, trabalhar todos! Por isso defendemos a Jornada semanal de 35 horas por lei já, ou melhor, ainda na semana de quatro dias da que falou Cándido Méndez em uma entrevista de rádio recente.

E enquanto não se assegura um emprego, que se garanta o caráter indefinido do auxílio desemprego e sua ampliação aos que agora não dispõem dele. Assim mesmo, há que exigir a moratória indefinida das hipotecas para todos os desocupados.

E à diferença das obras municipais do Plano Zapatero que só darão trabalho a um reduzido número de desocupados, por pouco tempo e, além disso, deixando uma boa parte do dinheiro nas mãos de empresas privadas, o que faz falta é um verdadeiro plano de obras públicas amplo e de longa duração para regenerar bairros e povoados, construir e pôr em marcha infra-estruturas e equipamentos públicos, regenerar o meio ambiente e criar para valer empregos em massa.

 

Que outras medidas vocês propõem?

 

Antonio: Como disse Juan Ignacio nós vimos defendendo a necessidade de um plano de resgate dos trabalhadores, que não se de Nem um euro mais aos banqueiros e as multinacionais! Porque estes setores estão ao serviço de uma classe parasitária, e não do conjunto da sociedade.

Um plano de resgate deve contemplar, entre outras medidas, cortar a sangria das demissões dizendo não aos EREs, autêntico instrumento de espólio dos trabalhadores. A cada empresa importante que queira fechar ou demitir em massa, deve ser nacionalizada e posta sob controle dos trabalhadores. É escandaloso que as ajudas públicas a empresas como SEAT superem seu valor em Carteira.

 

Também há que defender os serviços públicos, que são um direito e não um negócio: a previdência e a educação públicas de qualidade. Não se combate a crise sem tomar medidas determinadamente anticapitalistas. Por isso defendemos a expropriação das indústrias chaves e dos bancos. Todos os recursos centralizados no sistema bancário têm de estar ao serviço da imensa maioria.

 

Parecem a vocês sinceramente realistas essas propostas?

 

Juan Ignacio: Quando os governos sangram o erário público para resgatar aos banqueiros e às multinacionais para que mantenham seus negócios enquanto milhões de trabalhadores vão à rua, se diz que é uma medida “necessária” e “realista”. Isso é cinismo. Nós dizemos Basta! De que os que encheram os bolsos especulando e com o suor dos trabalhadores agora queiram seguir juntando fortunas no meio da miséria geral. Se quiserem ir que se vão! Porém as fábricas, os recursos ficam aqui, porque os trabalhadores sabem fazer funcionar a fábrica, os hospitais, os transportes, as escolas sem necessidade destes parasitas sociais. Conseguir estas medidas não depende mais do que da capacidade que tenhamos nós trabalhadores de nos mobilizar, de criar no próximo período a correlação de forças para impor essas medidas.

 

Antonio: Essa é a razão pela que se faz imprescindível a convocação de uma Greve Geral. Nós vimos apoiando todas as lutas que podemos, buscando a confluência e a unidade entre os trabalhadores para ganhar essas lutas e para preparar as condições dessa greve geral. Por isso temos saudado e lhes desejamos um grande sucesso aos companheiros que têm marcada uma greve geral no próximo dia 21. Desejamos que seja um sucesso e nos ajude a todos a avançar para uma greve geral em todo o estado espanhol.

 

Vocês diziam no início da entrevista, que a soberania dos povos era um tema central de sua candidatura

 

Juan Ignacio: Exatamente. Nós dizemos que não queremos um Estado que seja cárcere dos povos. Nós achamos que aqui não há nem de longe um marco de plenas liberdades democráticas onde os povos possam exercer seu livre direito à autodeterminação. Nós queremos a união, mas uma união livre decidida pelos povos e não imposta por ninguém.

 

Não há, além disso, um marco onde todos os projetos políticos, inclusive os que não compartilhamos, tenham as mesmas oportunidades de serem defendidos em liberdade. Pelo contrário, leis antidemocráticas como a Lei de Partidos prendem e põe na ilegalidade por delitos de opinião, por isso defendemos que deve ser revogada.

 

Antonio: Nós pensamos que a única garantia real de transformação social, de conseguir acabar com este sistema capitalista e abrir o caminho a uma sociedade sem exploração, de pleno emprego, direitos e igualdade real, uma sociedade socialista, é a luta unida de todos os trabalhadores acima de nosso lugar de origem, raça ou credo religioso. Mas não é possível essa unidade se nós trabalhadores espanhóis acabamos sendo ativa ou passivamente cúmplices na opressão a outros povos.

Aqui quando se fala de nacionalismos se menciona em termos, muitas vezes desdenhosos, aos bascos, catalães, galegos… Mas esquecem-se sempre de um, o nacionalismo maior e o mais perigoso porque não se reconhece a si mesmo como tal nacionalismo, o nacionalismo espanhol.

Os trabalhadores andaluzes, madrilenhos, estremenhos devem ser os primeiros em recusar ser o vagão de fila do nacionalismo espanhol. Defendemos a soberania de todos os povos, seu direito irrestrito a decidir o vínculo que querem com os demais povos, só assim se exerce a soberania.

 

Gostariam de acrescentar algo mais?

 

Antonio: Queremos desde aqui fazer um apelo aos trabalhadores, estudantes, com os que vimos lutando lado a lado contra os EREs, as demissões, a privatização da Previdência e o Plano Bolonha, contra a Lei de estrangeiros, em solidariedade com Palestina ou pela República, a que apóiem esta candidatura.

 

Juan Ignacio: Gostaria de dizer a esses companheiros que têm dúvida de que apoiar e votar em nós é “útil”, que cada apoio e cada voto é enormemente útil, porque se elegemos algum deputado estaremos garantindo que se ouça a voz dos trabalhadores e dos povos. E se não o conseguirmos, cada voto terá sido o respaldo a um programa de classe e democrático a uma opção de luta. Isso nos fará mais fortes para seguir na luta a cada dia, que é o verdadeiro caminho para que nós trabalhadores consigamos mudar as coisas.

 

Notas:

[1] Corrente Vermelha na tradução literal.

[2] Projeto de reforma universitária proposto pelo governo espanhol com a justificativa de equiparar o ensino superior da Espanha com o restante dos países europeus, mas que na prática, significa subordinar a educação pública às necessidades das empresas privadas.

[3] Modelo produtivo baseado no setor da construção civil.

 

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