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sexta-feira, março 29, 2024

Argentina| Queremos estar vivas, livres e sem dívida? Pela vida das mulheres, Emergência Nacional já!

O ano que terminou nos deixou, entre outras heranças, 327 feminicídios (um a cada 27 horas, embora o número em dezembro foi de 1 a cada 22 horas). Buenos Aires e Santa Fé estão no topo da lista de províncias com o maior número de feminicídios diretos e vinculados, transfemicídios e travesticídios, ainda que Córdoba, Chaco e Tucumán estejam próximas a esse recorde (1).

Por: PSTU-Argentina
Hoje as estatísticas não deixam dúvidas: aqueles que nos matam das maneiras mais cruéis e violentas todos os dias são nossos cônjuges ou ex-cônjuge. À terrível situação de violência que as mulheres sofrem, hoje se acrescenta outra categoria que se soma às mortes: o suicídio feminicida (2). Esses casos ocorrem principalmente em adolescentes abusadas ​​que não veem possibilidade de se libertar dos ataques sexuais aos quais são submetidas cotidianamente e encontram a única via de fuga possível no suicídio.
Este novo ano e a década que começa com ele não parecem escapar da lógica do aumento dos feminicídios: apenas nos primeiros 10 dias de 2020 já contamos mais 7 mulheres mortas. Talvez o mais brutal seja a morte de Valentina Gallina, de apenas 19 anos em Olavarría, que era militante contra a violência de gênero desde o feminicídio de sua mãe em 2008.
A estatística feminicida é apenas a ponta do iceberg da violência contra nós, mas esconde todas as outras necessidades urgentes, como mulheres que continuam a morrer de abortos clandestinos, ou casos como a menina estuprada por seu irmão de 15 anos e forçada a dar à luz em Misiones. A falta de Educação Sexual Integral (ESI), a terrível situação do sistema público de saúde, a necessidade urgente de casas abrigos para mulheres violentadas ou a criação de trabalho para mulheres, transexuais e travestis são apenas algumas dessas questões.
Mudança cultural e simbólica ou medidas concretas?
Enquanto isso, o Presidente Alberto Fernández e todos os membros do Gabinete Nacional fazem treinamento sobre Gênero e Violência no âmbito da Lei de Micaela. E por enquanto, apenas isso. A ministra Elizabeth Gómez Alcorta e Dora Barrancos, duas feministas que agora fazem parte do governo, foram encarregadas do treinamento.
É verdade que a visão que o poder e a justiça têm sobre a violência precisa ser modificada, mas é ainda mais verdade que há situações urgentes a serem abordadas e medidas mais urgentes a serem tomadas: desde a legalização do aborto que já foi discutida em 2018, ou a necessidade de uma Lei Nacional de Emergência contra a Violência contra as mulheres, todas as medidas concretas que exigem maior orçamento e decisão política para levá-las adiante, mesmo tendo que enfrentar os setores que pretendem nos levar de volta à Idade Média, como a Igreja Católica e as diferentes igrejas pentecostais (hoje todas sentadas à mesa do governo “contra a fome”). O Estado deve se separar do poder da Igreja Católica e de seu Papa Francisco, que envia rosários abençoados aos genocídios, em vez de proteger as vítimas de abusos historicamente cometidos pelos padres da Igreja. Pior, continua protegendo e encobrindo.
O governo nacional ainda continua argumentando que a legalização do aborto divide águas e, portanto, não é hora de levá-lo adiante. Ou que é necessário detalhar cifras e dados sobre violência para agir “seriamente”. Que outros dados são necessários para saber que as mulheres mortas por abortos clandestinos são todas pobres e trabalhadoras?
Que outra cifra, além de 327 feminicídios, para saber que cada dia mais e mais mulheres e suas filhas ainda estão morrendo nas mãos da violência machista? Ou que a diferença salarial entre homens e mulheres ainda é enorme, muitas vezes mascarada em diferenças de bônus, sem pagamento de ausência de mulheres em seus empregos para tarefas de assistência familiar de filhos, idosos, etc., ou por não serem contratadas em horas noturnos ou tarefas insalubres, o que consolida uma lacuna de 27% menos de renda para as mulheres (3). Isso no caso de ter um emprego, já que hoje é uma situação privilegiada na Argentina, onde o desemprego e a pobreza castigam muito mais as mulheres que os homens.
É por tudo isso que o governo deve parar de falar apenas sobre medidas simbólicas e culturais, ou simplesmente em pesquisas e números. Não adianta nada se não se colocam a trabalhar alocando um orçamento maior para combater essas situações que não podem mais esperar. A própria ministra Gómez Alcorta, que acabava de assumir o cargo, disse: “Estamos baseados em dois eixos centrais: o desenho, a execução e a avaliação de políticas públicas no campo da prevenção e erradicação da violência de gênero em todos os seus tipos e modalidades, incluindo assistência e reparação para suas vítimas; e, em segundo lugar, o desenho, execução e avaliação de políticas públicas nacionais voltadas para a igualdade e a diversidade, com o objetivo de promover a autonomia das mulheres e das pessoas LGTBI+. Para isso, será fundamental promover a formação, a pesquisa e o desenho de políticas que tenham como objetivo a promoção de mudanças culturais que, como condição necessária da igualdade, devem ser geradas na sociedade argentina” (4). Mas nem uma palavra ainda sobre destinar fundos necessários para essas tarefas.
Além disso, o movimento e as direções feministas dos quais vem a ministra, não estão fazendo nada nem fazendo propostas para lutar por essa grave situação, mas sim apostam e andam de mãos dadas com as expectativas nesse novo governo. Talvez elas possam esperar e ser pacientes, mas as mulheres do povo pobre e trabalhador já esperamos muito e muitas morremos na tentativa. Foi o próprio coletivo Ni uma Menos que, em 10 de dezembro, continuou sustentando que “Nossa luta continua, compartilhamos a esperança popular de um novo tempo e estamos juntes para exigir que as promessas sejam cumpridas. A rua é a nossa casa e de nossa casa não saímos. Ficamos até que a dignidade seja uma prática. Até que a vida seja como sonhamos. Nem um a menos! Nos queremos vivas, livres e sem dívidas!”(5) Mas estar nas ruas e permanecer mobilizadas diante de todo feminicídio, ou exigindo que se deixe de pagar a dívida externa para realmente cumprir essa consigna, SUA CONSIGNA, nem pensar.
Há muito tempo declaravam “Pátria ou Abutres”. Hoje, silêncio e apoio incondicional ao governo Fernández, que diz que continuará pagando a dívida de qualquer maneira. Nós, não devemos e não podemos esperar mais.
Da mesma forma, as centrais e direções sindicais apostam em um pacto social que nos obriga a continuar nos empenhando mais uma vez, e é à custa de nosso esforço e de nossa vida que eles continuam enriquecendo aqueles que já são ricos e donos do mundo·
A dívida ou a nossa vida
Nesta situação de emergência, onde são os trabalhadores que pagam com mais miséria, desemprego e morte a crise que foi causada pelos mais poderosos e ricos, é urgente parar de pagar a dívida externa milionária. Negociar para continuar pagando às nossas custas não é saída. É apenas mais um ajuste e reordenar as contas para continuar descontando nas nossas costas.
Para nós, isso significa mais mortes, mais violência, mais aborto clandestino e mais pobreza para nossas famílias. Não podemos continuar dependendo da Atribuição Universal por Filho (Hijo em espanhol) (AUH) ou de um cartão de alimentos que não é suficiente para a família. Precisamos de uma Lei de Emergência Nacional com um orçamento adequado para abrigos familiares, restaurantes para filhos/as, trabalho, saúde e educação para todes. E isso somente conseguiremos mobilizadas nas ruas exigindo o não pagamento da dívida externa e nos organizadas para continuar reivindicando o que precisamos. É a dívida externa ou nossas vidas e a de nossas famílias.
(1)
https://www.lanacion.com.ar/seguridad/registran-327-femicidios-lo-va-del-ano-nid2319952
(2) http://www.dpn.gob.ar/documentos/Observatorio_Femicidios_-_Informe_Parcial_-_Octubre_2019.pdf
(3)
https://www.pagina12.com.ar/240000-la-brecha-salarial-entre-mujeres-y-hombres
(4)
https://www.casarosada.gob.ar/gobierno-informa/46609-el-ministerio-de-las-mujeres-generos-y-diversidad
(5) https://www.facebook.com/notes/ni-una-menos/a-cuatro-a%C3%B1os-de-macrismo-y-cuatro-a%C3%B1os-de-niunamenos-vamos-por-todo/1234860080038505/
Tradução: Lena Souza

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