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sexta-feira, março 29, 2024

Acordo PSOE – Unidos Podemos: muito barulho e pouca ação

O governo de Pedro Sánchez e Unidos Podemos conseguiram um “Acordo de Orçamentos Gerais do Estado”. Os dirigentes do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e Podemos não pouparam elogios ao acordo que busca garantir o novo governo até 2020.

Por Ángel Luis Parras

Pregam suas bondades com slogans sobre o aumento do salário mínimo, reverter os aspectos mais negativos da reforma trabalhista, políticas de igualdade… A campanha inapresentável da dupla Casado e Rivera (Pablo Casado, Albert Rivera) aparece dando uma cor “progressista” ao acordo. Na realidade, é assim? O acordo se “esquece” das promessas de Sánchez e Iglesias na oposição. Está muito atrás das exigências das ruas.

Não altera nenhum elemento básico das contrarreformas do PSOE e do Partido Popular (PP) nem o sistema fiscal. Tem muito de marketing e pouco ou nada de conteúdo social. Além disso, dão por certo, quando ainda tem que passar pela União Europeia e pela maioria parlamentar que eles não têm.

Um salário mínimo de 900 euros para todos/as?

O aumento do Salário Mínimo Interprofissional (SMI) para 2019 é a menina dos olhos do Acordo. É um aumento que está abaixo do compromisso que Sánchez fez em sua posse, quando falou em aumentar a 1000 Euros em 2020. E ainda está muito mais longe das recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para fixá-lo em 60% do salário médio, o que significa 1200 euros. Fica muitíssimo distante do SMI na Alemanha de 1.498 € ou da França de 1.498,5 €; da Itália 1.642,3 € ou da Irlanda 1.614 €. Poderíamos inclusive até duvidar se realmente vão cumprir, tendo em conta o incumprimento patente da promessa sobre o SMI que Zapatero fez em 2004.

O aumento do SMI é praticamente irrelevante sem derrotar as reformas trabalhistas

Eles não explicam entre os/as trabalhadores/as qual é a incidência real, pratica desta medida anunciada. O SMI é um instrumento que tem, em teoria, como função principal fixar um piso salarial que garanta um ingresso mínimo. Mas o efeito real do SMI não pode ser avaliado dissociando do modelo de relações trabalhistas. A redução geral dos salários que tem acompanhado a crise e que perdura na cinicamente chamada “recuperação econômica”, está vinculada à proliferação das jornadas de trabalho de tempo parcial, aos contratos por tempo determinado, ao rebaixamento de categorias, às horas extras não remuneradas, o chamado subemprego.

Por isso falar em aumentar o SMI como “principal medida” quando prevalecem as reformas trabalhistas é puro charlatanismo. O salário mínimo, sem derrotar as reformas trabalhistas, para além da autoproclamação, tem um efeito minguado. Na realidade, até nos setores com piores salários, como hotelaria, comercio ou limpeza, os acordos estabelecem “pisos salariais” que superam o novo SMI.

É uma medida de luta contra a pobreza?

Até o ano de 2004 o SMI tinha duas funções: a teórica, trabalhista, de garantia salarial mínima e a de ser base de cálculo para empréstimos ou rendas sociais. O governo de Zapatero, com o apoio da Confederação Sindical das Comissões Operárias (CCOO) e da União geral dos Trabalhadores (UGT), introduziram uma mudança importante.

Para que esses aumentos do SMI não repercutissem “negativamente nas contas públicas” a função do SMI como indicador de referência para determinados empréstimos foi eliminada e se criou outro indicador para estas funções: o Indicador Público de Renda de Efeitos Múltiplos (IPREM). O IPREM é a referência que atualmente baliza o acesso e a quantia de ajudas, vagas na universidade, subsídios, empréstimos, entre elas as do desemprego. O IPREM era em 2008, 516,90 € por mês e está, agora em 2018, em 537,84 € ao mês. O acordo assinado pelo PSOE e Unidos Podemos não acolhe nenhum aumento neste indicador chave para as ajudas sociais.

Reforma Trabalhista: pelos seus atos vão conhecê-los

O acordo fala de mudar “os aspectos mais prejudiciais da reforma trabalhista” do PP de 2012. Quão longe estão aqueles tempos onde Podemos registrou no Congresso uma proposição na qual exigia revogar, além da reforma trabalhista do PP, a aprovada em 2010 pelo governo Zapatero, porque já “marcava o rumo para a ‘erosão’ de muitos desses direitos, particularmente os vinculados a negociação coletiva”.

Por isso, reverter unicamente a normativa de 2012 do PP seria “claramente insuficiente” (La Vanguardia 3/3/2016). Mas agora, por pressão da União Europeia e da patronal, não se atreveram sequer com a reforma do PP. Continua prevalecendo as convenções e acordos de empresa sobre os acordos setoriais, E nem sequer suprimem os limites da ultraactivdad (prolongação da vigência do acordo posterior ao seu término).

Somos velhos, mas não idiotas.

Esse é um dos gritos mais reiterados nas lutas dos e das aposentadas/os. O Acordo diz: “Se garante o poder aquisitivo dos aposentados de acordo com o IPC” e “ as aposentadorias mínimas e não contributivas vão aumentar 3%”. E isso resolve os temas centrais que deram origem a luta dos e das aposentadas/os?

1º – O aumento do IPC “em que garante o poder aquisitivo” de dois milhões de aposentados que ganham entre 150 e 500 euros? Inclusive aumentando os 3%, garante o poder aquisitivo receber todos os meses 154,50 euros? O problema é que 6 milhões e meio de aposentados recebem uma aposentadoria que não chega aos 1000 euros e isso não resolve com o IPC, por isso uma das reinvindicações centrais do movimento tem sido e é o valor mínimo de 1084 euros, uma reinvindicação que não está no Acordo, e nem se espera.

2º – O PSOE apresentou uma emenda ao projeto de Orçamentos de 2018 do governo Rajoy para revogar o fator de sustentabilidade das aposentadorias e Unidos Podemos apresentou proposições de lei para eliminar dito fator.

Porém agora no Acordo não se diz nenhuma palavra do “fator de sustentabilidade” com o que pretendem cortar a quantia das aposentadorias futuras, pois lembremos que sua aplicação está adiada, mas não eliminada.

3º – Da reinvindicação central, de garantir o Sistema Público de Aposentadoria, que as aposentadorias se garantam pela Economia Geral do Estado (como estava antes do Pacto de Toledo) nem falar sobre o tema!! Na realidade é o acordo do Pacto de Toledo, o de sempre, os que apostam por um sistema misto de aposentadorias públicas de miséria e pensões privadas que pagarão os e as que possam para o lucrativo negócio dos bancos, seguradoras e… burocratas do CCOO e UGT.

Uma omissão vergonhosa: 700.000 empregados/as públicas/os e um Expediente de Regulamentação de Emprego (ERE) encoberto,

Trata-se de um acordo entre o Partido que Governa e aquele que o sustenta no parlamento. Como é possível que em matéria de emprego público, onde são responsáveis diretos, ou seja, são os “patrões”, nem se menciona o tema?

Não dizem nem meia palavra de como repor os mais de 220.000 postos de trabalho perdidos nas Administrações públicas entre 2010 e 2017. Nem meia palavra dos mais de 700.000 empregados/as públicos contratados em fraude da Lei[1] desde 15, 20 ou 30 anos que se vêm hoje ameaçados de demissões com a finalidade de reduzir a taxa de temporalidade exigida pela União Europeia.

Como eles denunciam atualmente nas ruas “Este acordo não é senão um Expediente de Regulação do Emprego, o maior conhecido nesse país. Centenas de milhares de trabalhadores e trabalhadoras com mais de 45 anos, e um currículo quase exclusivo como servidores públicos, estaremos condenados a miséria junto com nossas famílias”.

Seu silencio é uma declaração de guerra a estes milhares de trabalhadores/as, do Governo e de quem o sustenta.

Os grandes empresários e os ricos vão continuar sem pagar.

Os que assinam o Acordo, na oposição diziam que o sistema fiscal era injusto e devia ser profundamente mudado. Mas o que existe no Acordo são somente mudanças na aparência. A medida fiscal rege, o pagamento de um mínimo de 15% sobre benefícios às grandes empresas, ficou desvalorizado ao aplica-lo, tal como reclamava os grandes da IBEX 35, à “base de cálculo” do imposto e não o resultado contábil. As mudanças no imposto de renda, o imposto de patrimônio são irrelevantes. O novo imposto de “transações financeiras” e o “imposto google” são um brinde ao sol com escasso e incerto impacto e as medidas de luta contra a fraude são uma piada.

[1] A fraude da lei pode supor a nulidade da norma aplicada se for contrária à ordem legal superior.

Tradução: Túlio Rocha

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