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terça-feira, setembro 26, 2023

Aumentos no Chile| Os trabalhadores cada dia mais pobres, os empresários cada dia mais ricos

Não é mistério para ninguém que os aumentos estão atingindo duramente as famílias da classe trabalhadora e que nossos salários não são suficientes para viver. Nos últimos 12 meses, o preço do pão aumentou 28,2%, o do óleo vegetal, 60%, o da farinha, 58%, o do óleo diesel, 45,2%, o do açúcar, 49,9%, e assim por diante, para muitos produtos de primeira necessidade.

Por: MIT-Chile

No entanto, o fenômeno dos aumentos constantes não afeta apenas os produtos de necessidades básicas, mas também alguns serviços, como aluguéis, crédito para moradia ou o custo da educação. Mas esses aumentos não são aleatórios, são consequência de processos inflacionários no funcionamento da economia capitalista e o Chile encerrou 2022 com uma inflação de 12,8%, a mais alta em 30 anos.

Embora a inflação pareça um conceito abstrato para os trabalhadores, ela é evidente quando vamos comprar nossos alimentos e nos vemos pagando o dobro, pela metade dos produtos que comprávamos antes. A inflação, em economia, é quando há um aumento generalizado e sustentado nos preços de bens e serviços em um período de tempo. Ela é medida por variações no IPC (Índice de Preços ao Consumidor), que representa o nível do custo de vida e é calculado com base em uma cesta básica de bens e serviços. Esse índice também é usado para regular ou reajustar aluguéis, salários, créditos, transporte público, serviços de água e eletricidade etc. Embora as causas da inflação se devam a vários fatores, nosso país não está alheio ao processo inflacionário global, que, como argumenta o economista Michael Roberts: “É o resultado de um ‘choque de oferta’: escassez de produção e interrupção da cadeia de suprimentos induzida pela pandemia da COVID e depois pelo conflito entre a Rússia e a Ucrânia”.

Por mais incompreensível que isso possa parecer para nós, sabemos que as consequências disso são pagas pelos trabalhadores, porque, em termos concretos, a inflação afeta os salários em geral; os preços dos alimentos dobraram e, portanto, os salários estão se desvalorizando em relação ao custo de vida.

Salários no chão, lucros no céu

De acordo com os dados fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), enquanto os salários reais dos trabalhadores em janeiro de 2023 acumularam 14 meses de queda devido a esse processo inflacionário, em contrapartida, os lucros das grandes empresas continuaram a aumentar. O setor bancário obteve lucros exorbitantes durante o ano de 2022, que aumentaram 44%, chegando a 5,5 bilhões de dólares; e como a economia chilena é um modelo de alta concentração de riqueza, os proprietários dos bancos são também os proprietários da terra, das empresas e do capital. Eles dominam os mercados, a distribuição, os ativos financeiros e a mídia, e todos os lucros vão para poucas mãos.

Ao mesmo tempo, os lucros das grandes empresas chegaram a 45 bilhões de dólares em 2022. Cinquenta por cento desses lucros estavam concentrados em dez empresas, a maioria delas pertencente aos grandes grupos econômicos chilenos, como Luksic, Matte e Angelini. Em outras palavras, enquanto nós, trabalhadores, estamos cada vez mais pressionados pela inflação, os grupos econômicos, as dez famílias que são donas de todo o Chile, estão acumulando lucros extraordinários.

E por que não aumentam os salários?

Então, se está ficando cada vez mais caro para nós, trabalhadores, viver, se nossas vidas estão ficando mais pobres, por que os salários não aumentam? Enquanto o governo Boric e Apruebo Dignidad obedecem às políticas monetárias do Banco Central e às políticas direcionadas do modelo neoliberal, como o subsídio familiar para pessoas com recursos limitados (que correspondem apenas a 60% das famílias mais pobres, não a 60% da população), eles não estão nem um pouco preocupados com o fato de que, com a inflação crescente, nossas casas estão se tornando ainda mais precárias e que precisamos de um aumento geral nos salários. O próprio ministro Marcel declarou que “devemos equilibrar adequadamente tanto a demanda por reajuste salarial quanto o cuidado com o emprego” para enfrentar a próxima negociação com a Central Unitária de Trabalhadores, que, por sua vez, propõe um salário mínimo insuficiente de $500.000 pesos.  Em tempos de maior carestia para a classe trabalhadora, governos e empresários falam sobre responsabilidade fiscal e usam velhos mitos, como o de que o aumento dos salários aumentaria a inflação porque há mais dinheiro em circulação, e até mesmo continuam a incutir a ideia de que a inflação dispararia se houvesse uma nova retirada das AFP.

O mito de que um aumento no salário mínimo aumentaria a inflação baseia-se no fato de que a maioria dos contratos coletivos negociados pelos trabalhadores tem o salário mínimo como piso e um aumento no salário mínimo implica um aumento na negociação de salários em geral, mas o fenômeno inflacionário atual não tem nada a ver com isso. Esse mito serve para que as grandes empresas mantenham os salários baixos e aumentem ou, pelo menos, não diminuam sua taxa de lucro. Consequentemente, elas negociam para aumentar os salários abaixo da inflação ou para aumentá-los o mais baixo possível a fim de preservar seus lucros.

Também não há qualquer evidência de que a inflação esteja relacionada aos saques das AFP; de fato, as AFP se financiaram vendendo ativos no exterior, importaram dólares e mitigaram seu preço reduzindo a inflação; portanto, não é a causa da inflação, e grande parte desses saques retornou às instituições bancárias para pagar dívidas.

Então, como podemos explicar que, enquanto nossos salários permanecem tão baixos e perdem poder de compra, os empresários continuam aumentando seus lucros?

A primeira resposta é que os empresários mantêm os salários baixos para apenas garantir a subsistência do trabalhador, repor suas forças para produzir e garantir a reprodução da mão de obra para não diminuir seus níveis de lucro e, assim, aumentar a exploração dos trabalhadores. Por exemplo, de uma jornada de trabalho de 8 horas, apenas 3 horas são destinadas aos salários e as 5 horas restantes são para os lucros dos capitalistas. Isso está diretamente relacionado ao desemprego e à existência do chamado “exército industrial de reserva”, ou seja, milhões de pessoas desempregadas que estão dispostas a trabalhar pelo mínimo.

A segunda é que os empregadores usam o conluio, que é quando três ou quatro grandes monopólios concordam em manter os preços mais altos para seu próprio benefício. Isso só é possível devido à alta concentração de propriedade em poucos grupos econômicos. Enquanto a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) indica uma variação descendente dos alimentos nos índices de preços dos cereais, óleos vegetais e laticínios, no Chile os preços dos alimentos continuam subindo ou não diminuem, por exemplo.

O terceiro elemento que explica por que os salários no Chile são tão baixos, independentemente da inflação, é a natureza da própria economia. O Chile tem uma economia exportadora de produtos primários e de baixo valor agregado (minerais, peixes, frutas) e carece de desenvolvimento científico e industrial. Isso impede a criação de empregos altamente qualificados. Um fato que demonstra claramente essa realidade é que mais de 98% dos empregos recuperados após a pandemia são precários (com baixa previdência social, tempo parcial etc.). A mediana dos salários da classe trabalhadora são piores do que eram há 6 anos. Todos os índices são piores para as mulheres, onde 3 em cada 4 declaram sustentar o lar. A única coisa que o trabalhador possui é sua força de trabalho, que ele vende como mercadoria ao preço imposto pelo capitalista, e em nosso país a maioria dos trabalhadores não negocia coletivamente.

Enquanto nossa situação de vida está piorando, as direções da maioria dos sindicatos, federações e centrais sindicais, em vez de organizar os trabalhadores com base em suas necessidades reais, sentam-se com os vários governos e empresários para negociar as migalhas que caem de suas mesas. Isso precisa acabar. Precisamos elaborar uma lista urgente de demandas da classe trabalhadora com base em nossas necessidades reais, que discutimos neste artigo.

Tradução: Tae Amaru

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