qui mar 28, 2024
quinta-feira, março 28, 2024

Os desafios da classe trabalhadora após derrotarmos Bolsonaro nas urnas

A derrota eleitoral de Bolsonaro no 2º turno foi recebida com comemoração e, sobretudo, alívio pelos trabalhadores e trabalhadoras, a juventude e os setores mais oprimidos. Com muita razão.

Por: PSTU Brasil

Bolsonaro expressa um projeto autoritário, que ameaça as poucas liberdades democráticas que temos hoje. Por isso, o PSTU fez campanha pelo voto crítico em Lula neste 2º turno.

A chapa Lula-Alckmin, contudo, não representa uma real alternativa a Bolsonaro do ponto de vista da política econômica, tampouco será capaz de derrotar a ultradireita em definitivo. Mas, se Bolsonaro permanecesse à frente do aparelho do Estado, isto facilitaria seu projeto autoritário.

Uma amostra do que estar por vir da extrema-direita

O dia da eleição e as 48h que se seguiram foram uma pequena amostra disso. Primeiro, o governo coordenou uma ação de sabotagem, através da Polícia Rodoviária Federal (PRF), para impedir ou atrasar milhares de pessoas de exercerem seu direito democrático de votar, sobretudo no Nordeste.

Depois, com a confirmação de sua derrota nas urnas, mobilizou sua base mais ferrenha, através das redes sociais, para fechar estradas e protestar nas frentes dos quartéis, contestando as eleições e pedindo intervenção das Forças Armadas.

Através de declarações dúbias, Bolsonaro tentou se equilibrar entre a pressão de setores que exigiam um reconhecimento público da derrota e o núcleo mais radical da extrema-direita. E apenas aceitou iniciar a transição após consultar o comando do Exército sobre o apoio a uma eventual aventura golpista.

Essas eleições e os dias que se seguiram confirmaram o que PSTU já alertava. Após jogar todas as fichas para ganhar a votação nas urnas, sua prioridade, Bolsonaro não descartava partir para uma tentativa golpista, ainda que não tivesse forças para isso. Não contava com o apoio de setores majoritários da burguesia e principalmente do imperialismo, como tampouco tem a maioria do povo ao seu lado para tal.

Ele, contudo, buscou mobilizar sua base para tentar criar um clima de conflagração, manter a narrativa da fraude, como Trump fez nos EUA, e, uma vez fora da Presidência, negociar anistia para seus crimes. E, ainda, manter seu eleitorado mobilizado e conservar sua influência política no futuro.

Agora, estamos num momento em que a transição para o novo governo já começou. Bolsonaro, evidentemente, ainda pode aprontar alguma. Mas, a equipe de Lula já está tomando medidas.

Após a derrotarmos Bolsonaro nas urnas, é hora de preparar os próximos passos. Ficou ainda mais evidente que essa extrema-direita chegou para ficar, e só será derrotada, de verdade, com a organização e mobilização independente da classe trabalhadora. Enfrentando-a nas ruas e mudando as condições que possibilitaram seu surgimento e ascensão: a fome, o desemprego, a precarização e o processo de degradação, retrocesso e entrega do país.

CONTRAMÃO

Aliança com a burguesia não é o caminho para derrotar a ultradireita, nem para resolver nossos problemas

O novo governo ainda não assumiu, porém, os primeiros passos da transição entre os governos Bolsonaro e Lula já indicam o que nos espera. Confirma a manutenção da atual política econômica, apenas aparando as arestas dos arroubos ultraliberais de Paulo Guedes, mas dando continuidade a um governo com e para os bilionários.

Se o programa do PT e o amplo arco de alianças firmado ainda no 1º turno já mostravam essa tendência, agora vemos isso se concretizando. A escolha de Geraldo Alckmin para dirigir esse processo já era uma forma de indicar ao mercado que seus interesses permaneceriam intocados.

Depois, a aproximação com setores do Centrão, como o Partido Social Democrático (PSD), de Kassab, ou o próprio Arthur Lira. Isso foi reforçado com o convite para os banqueiros Pérsio Arida e André Lara Resende comporem a equipe econômica, com o apoio de Henrique Meirelles, homem de confiança dos banqueiros nacionais e internacionais.

Com banqueiros e o neoliberalismo

Tanto Pérsio Arida quanto Lara Resende foram formuladores do Plano Real e compuseram o governo FHC, responsável pela política de abertura da economia ao capital internacional, desnacionalização das empresas, privatizações, contrarreformas neoliberais, arrocho e desemprego.

Arida, inclusive, ocupava o Banco Central quando caiu, após a revelação de que vazou (para um sócio banqueiro) que o Real seria desvalorizado, numa manobra que, certamente, lhe garantiu alguns milhões.

Após esse escândalo, Pérsio Arida ainda trabalhou para o banco Opportunity, de Daniel Dantas, e ajudou a fundar o BTG Pactual, junto com Guedes. Foi um dos fundadores, ainda, do grupo Livres, uma espécie de laboratório de ideias liberal, com atuação multipartidária em siglas de direita, ao estilo do MBL.

Transição começou

As propostas que já avançam entre a equipe de transição e o Congresso Nacional, para o próximo ano, mostram que a orientação é manter tudo como está. Discute-se uma PEC ou uma autorização do TCU (Tribunal de Contas da União) para acomodar os R$ 600 do Auxílio Brasil a 21 milhões de famílias. Com isso, 46 das 67 milhões de famílias que recebiam o auxílio-emergencial continuarão de fora de qualquer programa de transferência de renda.

Já o salário mínimo, uma das principais promessas de Lula, deve ser reajustado num valor de apenas 1,4% acima do previsto pelo orçamento de Bolsonaro. O orçamento enviado pelo atual governo previa passar dos atuais R$ 1.212 para R$ 1.302. Já a proposta divulgada pelo PT é de R$ 1.320, uma diferença de menos de R$ 20, que sequer compra um pacote de arroz. Segundo o Dieese, o mínimo deveria ser de R$ 6.306,97, para cumprir a Constituição.

A atualização da tabela do Imposto de Renda e a promessa de isentar quem ganha até cinco salários mínimos, devem ficar só para 2024. A regra do Teto dos Gastos deve ser substituída por outra, mais flexível, mas com o mesmo conteúdo: manter o arrocho fiscal e priorizar o pagamento da dívida aos banqueiros.

Já a Reforma Trabalhista não só não deve ser revogada, como entidades e confederações patronais pressionam pelo avanço da Reforma Administrativa no setor público, medida, aliás, cujo maior defensor é justamente Meirelles.

Independência

Nenhuma confiança com o governo Lula-Alckmin

Para derrotar de vez a ultradireita e garantir as demandas da classe trabalhadora contra a patronal, devemos exigir do novo governo nossas reivindicações e organizar a luta unificada por elas. Confiar na força dos trabalhadores (as) e organizar a luta de forma independente e pela base

Por emprego, salário e terra

Devemos nos organizar para a revogação, por completo, das reformas Trabalhista e da Previdência. No mesmo sentido, em defesa do emprego, exigir a redução da jornada de trabalho, sem redução dos salários, com a garantia de pleno emprego e carteira assinada para todos, incluindo os trabalhadores por aplicativos, e aumento geral de salários.

Precisamos lutar pela Petrobras 100% estatal, sob controle dos trabalhadores, e a reestatização das empresas privatizadas, como a Vale e a CSN. Da mesma forma, parar o processo de entrega do país e todas as privatizações em curso.

É preciso exigir a demarcação das terras indígenas, a reforma agrária e o apoio à agricultura familiar, contra o agronegócio. A proteção do meio ambiente e dos povos originários, contra o Marco Temporal, assim como a reparação para o povo negro e garantia de direitos das mulheres e LGBTIs, além do fim da violência contra estes setores.

Por educação, saúde, moradia e serviços públicos de qualidade, precisamos acabar com a Lei de Responsabilidade Fiscal, substituindo-a por uma Lei de Responsabilidade Social, suspendendo o pagamento da dívida aos banqueiros. Acabar com o teto de gastos e sem qualquer lei que aplique o arrocho para beneficiar os banqueiros.

É preciso exigir, também, a investigação e punição exemplar de Bolsonaro e sua família, assim como todos os cúmplices dos crimes cometidos à frente do governo (página 8).

Organizar trabalhadores e oprimidos

A derrota de Bolsonaro nessas eleições abre a expectativa de que a vida melhore. Porém, infelizmente, é preciso alertar os trabalhadores que um governo atuando com  banqueiros, o grande empresariado e o agronegócio, como aponta essa transição, não vai garantir o fim da fome, ou do desemprego. Pelo contrário, vai continuar atacando e superexplorando os trabalhadores.

Mais do que isso, ao não enfrentar os bilionários, acabará por perpetuar as bases econômicas, políticas e sociais que possibilitaram o surgimento e crescimento dessa ultradireita. Pior, além de não a derrotar, tenderá a fortalecê-la.

Tudo isto, combinado com as alianças e compromissos que Lula vem assumindo com setores abertamente reacionários e fundamentalistas, só pode significar péssimas notícias para mulheres, LGBTIs, negros(as), indígenas e demais setores oprimidos (leia na página 6).

Para derrotar, de fato, a extrema-direita é preciso mudar e reverter esse processo de degradação e retrocesso do país. Para isso, é necessária a organização e mobilização independente da classe trabalhadora. Isso passa por organizar a nossa luta, pela base, fortalecer toda nossa organização independente da patronal e também nossa autodefesa.

DESAFIO

Organizar a oposição de esquerda e de classe

O próximo período será de grande desafio para a classe trabalhadora. Teremos um governo de aliança de classes que irá administrar a crise capitalista.

Ao contrário de 2003, no primeiro governo Lula, o horizonte da economia mundial aponta para o aprofundamento da crise. De outro lado, teremos a oposição de uma extrema-direita organizada, armada e radicalizada.

Experiências recentes na América Latina e a própria trajetória dos governos do PT, aqui, mostraram que a desmoralização de governos de Frente Ampla, de aliança com a burguesia, acaba sendo impulsionadora da extrema-direita.

A decepção que os trabalhadores têm com esses governos fortalece setores como o bolsonarismo. O pior erro que a esquerda socialista pode cometer é o de se colocar como um apêndice de um governo de aliança com a burguesia, justificando-se pela ameaça da ultradireita.

É lamentável, assim, a posição referendada pela direção do PSOL, de integrar a transição do futuro governo. Isso é, na prática, entrar e legitimar o governo Lula-Alckmin. Ou mesmo a posição divulgada por uma de suas correntes internas, o MES, de não integrar formalmente o governo, mas apoiá-lo por fora. Fazer isso é repetir a História e ajuda, mesmo que involuntariamente, a levar água ao moinho do bolsonarismo.

Só vamos derrotar a ultradireita, pra valer, com independência de classe, mobilização e autodefesa; e lutando para mudar as condições sociais, políticas e econômicas que possibilitaram seu surgimento. E isso não vai ser possível junto com um governo de aliança com bilionários.

Derrotar a extrema-direita e mudar o país

O PSTU alerta: temos de organizar e fortalecer uma oposição de esquerda que possa batalhar, em frente única nas lutas e nas ruas, para enfrentar a extrema-direita e, também, os ataques que inevitavelmente virão do novo governo.

Já vimos que não podemos depositar qualquer confiança nas instituições dessa “ricocracia” para defender as liberdades democráticas, como o STF ou o próprio Congresso, que, inclusive, será ainda mais bolsonarista. Não podemos, também, deixar os trabalhadores a reboque de setores como a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a Federação Nacional dos Bancos (Febraban).

Só a mobilização independente da classe trabalhadora pode defender de forma consequente as liberdades democráticas, o fim de toda opressão e acabar, de vez, com a extrema-direita, bem como defender as nossas condições de vida, a soberania do país e abrir caminho para que os trabalhadores governem e possamos dar um fim no capitalismo.

É preciso construir uma oposição da classe e de esquerda ao governo, nas lutas e nas ruas, que possa enfrentar tanto a ultradireita, como os ataques do capital, impulsionados pelo novo governo, aliado aos bilionários.

Defendendo e construindo uma organização socialista e revolucionária, o PSTU estará junto com a classe trabalhadora e seus setores mais oprimidos, em cada luta e nessa batalha.

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