Sempre é muito importante estudar o Equador. Dá-nos a impressão que sempre está se adiantando nos processos. Foi o primeiro país a ser dolarizado (no país não tem outra moeda) e serviu para que o imperialismo visse que era melhor dolarizar os preços. Em 2001, a partir de uma insurreição, os indígenas apoiados pelos petroleiros, destituíram o governo e chegaram a governar o país. De esse processo surgiu o primeiro presidente por fora dos partidos tradicionais e de cunho populista. Esse presidente eleito, perdeu o apoio popular e foi destituído pelo congresso tal qual Lugo no Paraguai e Dilma no Brasil. Em 2019, o Equador também foi o precursor das gigantescas mobilizações no Paraguai, Colômbia e Chile. Acompanhar as lutas e estudá-las é uma forma de ter uma noção para onde caminham os países da América do Sul.
Por: Cesar Neto
Uma crise sem precedentes no marco da decadência capitalista
Os efeitos da crise de 2019, os corpos incinerados nas ruas por conta da ausência do Estado durante a pandemia, uma inflação galopante onde a cidade não consegue comprar alimentos e os produtores do campo não conseguem pagar o diesel para transportar. Tudo isso combinado com a destruição ainda maior dos poucos serviços públicos de saúde e de educação. O desemprego que já era estrutural agora agigantou-se. Não restou outra alternativa que não seja a luta.
Radicalização da burguesia e a respostas das massas
O governo do banqueiro Lasso bem que tentou controlar o movimento utilizando o aparato repressivo. Primeiro prendeu o dirigente indígena Leonidas Isa; depois publicou um decreto de exceção que ninguém deu bola e finalmente invadiu um espaço tradicionalmente democrático que foi a Casa da Cultura Equatoriana (CCE), em Quito.
O tiro saiu pela culatra. A mobilização estava ainda muito fraca, engatinhando. A prisão de Isa e um certo mistério do que havia passado com ele provocou imediatamente a resposta do movimento indígena e também de setores das grandes cidades. A manifestação em Cotopaxi a terra natal de Isa foi impressionante. Havia 100 guardas para proteger o Palacio do Governo estadual e a avalanche de gente levou a que os policiais fugissem para dentro do palácio. A mesma coisa aconteceu com a ocupação da CCE. Imediatamente centenas e centenas de pessoas que estavam em suas casas em Quito saíram rumo a defesa do local.
O decreto de exceção era diretamente dirigido às províncias de Pichincha, Cotopaxi e Imbabura. A primeira é a província onde está localizada a capital e as outras duas são o centro da insurgência indígena. Imediatamente, começou um repúdio ao Estado de Exceção e a Assembleia nacional questionou publicamente sua validade. Posteriormente o governo publicou um segundo decreto de exceção que passava de três para seis províncias. Além disso, o decreto deixava claro o toque de recolher das 22 hs as 5hs da manha, as prisões sem mandado, ocupação de espaços públicos e até mesmo o uso de armas de fogo.
Grupos de ultra direita
Um fato novo no cenário politico equatoriano são ações de grupos de ultra direita. O equador é uma sociedade muito opressora para negros, indígenas e mulheres. Portanto, sempre houve esse setor social. A novidade é que desde os anos 80 não apareciam pessoas armadas, bem vestidas, em carros zero quilometro ameaçando as manifestações indígenas.
Esses grupos tratam de amedrontar os manifestantes frente a radicalização do movimento. Uma polarização impensável há alguns anos.
A CONAIE assume um novo papel
O processo de desindustrialização primeiro e o esvaziamento das empresas estatais tirou o protagonismo do movimento sindical urbano. Na insurreição de 2.000 embora as grandes figuras tenham sido indígenas, na condução politica os petroleiros jogaram um rol de dirigente.
Desde o final dos anos 90 a CONAIE tinha um programa baseado na plurinacionalidade e multiculturalidade. Uma luta progressiva contra a opressão capitalista. Porém agora, a CONAIE está assumindo um programa mais amplo, e que contempla outros setores sociais não indígenas.
Nessa mudança programática, ao reivindicar questões comuns aos setores urbanos, a CONAIE amplia o leque do papel dirigente e nas cidades o apoio das massas populares é também expressão dessa mudança.
Esse avanço programático, como dissemos acima, é bastante progressivo, porém está limitado às questões econômicas, sem avançar para a expropriação das terras ocupadas pelos capitalistas do campo e também sem avançar para o problema da subordinação ao imperialismo, em especial, no caso da produção petroleira e petroquímica que tem reflexo direto para os indígenas e camponeses na medida que necessitam do petróleo para a circulação da mercadoria e da produção de ureia para melhoria do solo.
A radicalidade não é apenas numérica, é também politica
Durante os primeiros anos do milênio muitas marchas e protestos se dirigiam a Assembleia Nacional, ao Tribunal Constitucional ou ao Palácio de Governo. Hoje o centro é outro: ocupar Quito é a palavra de ordem central. Não se trata de exigir algo das instituições do Estado, mas mostrar força ocupando a capital e impedindo seu livre funcionamento.
Para que isso ocorra há uma disputa pelo acesso à cidade e quando acedem a burguesia trata de impedir que os indígenas tenham um local para dormir. A solidariedade aos indígenas levou que as universidades tenham votado recebê-los em seus campus e a policia tenha impedido com violência o acesso.
As contradições entre força e programa
Os indígenas que vivem no campo e também os indígenas que vivem na periferia das cidades estão mostrando sua força e disposição de luta comandados pela CONAIE. Até onde estão dispostos a chegar em sua luta? Essa é a grande contradição. Com a força da mobilização os indígenas impuseram à direção da CONAIE a consigna do Fora Lasso. A direção da CONAIE vinha a um ano negociando com o governo e não tinha (nem tem) a intenção de colocar para fora o governo Lasso. Na verdade, isso fica nítido nas entrevistas de Isa quando diz que Lasso tem que retirar do seu governo os maus funcionários.
A consigna fora Lasso foi imposta pelo movimento durante suas marchas. Na verdade, a consigna deveria ser Fora Lasso e por um governo da Conaie apoiados nas assembleias populares.
Por quê é preciso acabar com o governo Lasso e criar um governo da Conaie apoiado nas assembleias populares?
Os indígenas do campo e da cidade estão demonstrando sua força, disposição de luta e acima de tudo o seu heroísmo. Mas é preciso entender que os grandes problemas como a contaminação dos rios, da destruição ambiental, da usurpação de terras, são problemas que atingem diretamente os indígenas e quem pratica esses crimes são os políticos burgueses como Lasso, Moreno e Correa e seus aliados da mineração.
Somente um governo da CONAIE, que se subordine as decisões das assembleias populares pode encarar de frente esses problemas e resolvê-los.
Os indígenas e os trabalhadores equatorianos necessitam nosso apoio
À medida que os indígenas vão ocupando Quito o governo dá ordem de reprimir, lançar bombas de gás, bombas de efeito moral, uso de balas de borrachas e até armas de fogo. Estamos frente a uma onda de violência muito grande e frente a possibilidade de tragédias.
O movimento sindical dos países semi coloniais e também dos próprios países imperialistas têm que dar um passo adiante rumo á solidariedade e apoio politico e material aos lutadores equatorianos.
- Liberdade aos presos políticos
- Cesse imediato da repressão
- Investigação das três mortes ocorridas.
- Punição aos policiais e militares envolvidos nas mortes e repressão.
- Todo apoio a luta do povo equatorianos
- Fora Lasso
- Por um governo da CONAIE apoiado nas assembleias populares.